O procurador da Lava Jato que desabafou no Facebook deveria pedir desculpas a Dilma. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 17 de junho de 2017 às 14:27
O procurador Lima, da Lava Jato

 

Já que o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima gosta de usar o Facebook, para comentários sobre política e desabafos, ele bem que poderia ser o primeiro a pedir desculpas a Dilma Rousseff por ter colaborado, conscientemente ou não, para tirá-la da presidência da república.

Em uma de suas mais recentes postagens, ele diz:

Infelizmente, entretanto, algumas das pessoas que nos apoiavam o fizeram por motivos mesquinhos ou ingênuos. Os primeiros queriam apenas substituir um partido pelo seu próprio partido, sem qualquer pretensão de buscar o bem comum. 

O fato é que a Lava Jato contribuiu, decisivamente, para o resultado do jogo político.

Carlos Fernando não sabia que os policiais federais que trabalharam ou trabalham com ele militavam nas redes sociais em favor da campanha de Aécio Neves a presidente?

Igor Romário de Paula, um dos delegados que chefiam a Lava Jato, pediu votos nas redes sociais para Aécio e participou de um grupo no facebook chamado Organização de Combate ao Crime Organizado.

A imagem do grupo mostrava Dilma com dois dentes para fora da boca e o selo “Fora, PT!”.

Em uma das postagens, que mostravam Aécio rodeado de mulheres, escreveu: “Esse é o cara!!!!!”

Ele também compartilhou link de uma revista inglesa (Economist), que defendia o voto em Aécio: “Brasil precisa se livrar de Dilma e eleger Aécio”.

A jornalista Júlia Duailibi, do Estadão, relatou este e outros exemplos de militância em favor de Aécio no interior da Lava Jato.

“Alguém segura essa anta, por favor”, declarou o delegado Marcio Anselmo, ex-coordenador da Operação Lava Jato, em uma notícia cujo título era: “Lula compara o PT a Jesus Cristo”.

Como cidadão, a manifestação é livre, mas, para policiais que trabalhavam na investigação de corrupção nas estatais do governo, declarar apoio a Aécio significava fechar os olhos para o que já se sabia da participação do PSDB nos esquemas de roubalheira.

A Lava Jato foi seletiva contra o PT e contra um ou outro membro do PMDB até que, em Brasília, a equipe de Rodrigo Janot escancarasse as portas que blindavam Michel Temer, Aécio Neves e outros tucanos.

O que foi feito com a informação, contida na delação de Nestor Cerveró, de que o filho de Fernando Henrique Cardoso, Paulo Henrique, foi beneficiário da corrupção na Petrobrás?

Ele prestou depoimento? Teve sigilo quebrado, como aconteceu com os filhos de Lula?

Duas fotos são simbólicas desse momento em que a Justiça, principalmente em Curitiba, se apresenta com dois pesos e duas medidas.

Em uma, Moro aparece sorridente conversando ao pé do ouvido com Aécio.

Em outra, ele sorri feliz no cumprimento a Michel Temer.

A Lava Jato de Curitiba foi tudo, menos republicana.

Comparando as datas das principais fases da operação com o calendário eleitoral ou das manifestações, encontra-se uma sincronia.

Por exemplo, no dia 6 de março de 2016, Moro determinou a condução coerciva de Lula, sexta-feira da semana anterior a uma manifestação programada pelos movimentos anti-PT – o pretexto era corrupção, mas a motivação era outra: vingar-se da derrota eleitoral de 2014.

Os líderes das manifestações em todo o Brasil comemoraram o que chamaram de injeção de ânimo dada pela Lava Jato com aquela condução coercitiva.

Um deles, Syllas Valadão, de um movimento chamado Patriotas, disse que a presença do público nas ruas dobraria graças à força dada pela turma de Curitiba.

E foi o que aconteceu.

Era uma manifestação de enorme maioria branca e de classe média.

Mas, para quem queria uma foto de muita gente na rua para justificar a derrubada da presidente, isso não importa.

Era o que faltava para impulsionar o golpe.

Com o apoio dos antigos adversários de Dilma e do PT, Michel Temer mudou de lado e assumiu, pouco depois, o Palácio do Planalto.

E do palácio ele não quer sair, apesar do selo que carrega na testa: “chefe da quadrilha mais perigosa do Brasil”, como definiu o corruptor confesso Joesley Batista, na entrevista à revista Época.

Michel Temer tem, a seu favor, o silêncio cúmplice dos ex-batedores de panela.

Em 26 de setembro de 2016, também na sexta-feira da semana anterior às eleições municipais, a Lava Jato prendeu Antônio Palocci, ministro da Fazenda de Lula.

O ministro da Justiça de Temer na ocasião, Alexandre de Moraes, deixou um registro histórico, ao antecipar para militantes do MBL em Ribeirão Preto que haveria uma grande operação na véspera da eleição.

“Vocês vão se lembrar de mim”, disse ele, com um sorriso maroto, conforme captaram câmeras de celular dos militantes de direita.

A vitória do PSDB, partido a que o ministro Alexandre de Moraes era filiado, e a derrota do PT devem, em grande medida, à repercussão da prisão de um dos nomes mais expressivos do PT.

Quanto a prisão de Palocci contribuiu para que não houvesse segundo turno em São Paulo e Doria vencesse com facilidade?

Óbvio que ninguém defende a impunidade – se há motivos para Palocci ser investigado, processado ou até mesmo preso, que seja –, mas parece evidente que o relógio da Lava Jato de Curitiba parecia sincronizado com as ações da direita no Brasil.

No desabafo postado no Facebook, Carlos Fernando dos Santos Lima diz que algumas das pessoas que os apoiaram o fizeram por motivos mesquinhos ou ingênuos.

E sobre ele próprio e os demais membros da Lava Jato de Curitiba? Ao conduzir uma investigação e um processo que, ao final e ao cabo, serviram para derrubar Dilma e agora interditar Lula, o fizeram por ingenuidade ou mesquinharia?

Ou existe outra motivação?