O que a oposição poderia aprender com Felipe Neto. Por Kiko Nogueira

Atualizado em 7 de setembro de 2019 às 19:50

Não há nada mais poderoso do que uma ideia cujo tempo chegou, cravou Victor Hugo.

O youtuber Felipe Neto embarcou no barco progressista desde as eleições de Jair Bolsonaro. Explodiu em audiência e influência.

Seu lance mais recente é a distribuição gratuita de 10 mil livros com temas ou personagens LGBT na Bienal do Livro no Rio de Janeiro.

O ato acontece na praça de alimentação. 

Felipe reage ao obscurantismo picareta do prefeito Marcelo Crivella, que tentou censurar uma HQ por causa de uma cena de beijo gay.

Crivella considera isso pornografia e, portanto, atentaria contra o Estatuto da Criança e do Adolescente.

As obras que Felipe está entregando vão dentro de um saco preto com uma etiqueta: “Este livro é impróprio – para pessoas atrasadas, retrógradas e preconceituosas”.

O sucesso de público e crítica é enorme. Caetano Veloso, entre outros, o elogiou.

“Temos que retomar a consciência da sociedade brasileira”, disse o cantor num vídeo.

Felipe está dando pistas para a oposição que estão sendo solenemente ignoradas.

Resumindo, trata-se de senso de oportunidade, de capturar o zeitgeist, o espírito do tempo, e montar nele.

Noam Chomsky afirmou que a esquerda deveria se unir em torno da crise na Amazônia. Não se uniu. Só Marina Silva ressurgiu, ocupando bom espaço num área de sua expertise.

Não há ninguém falando a sério sobre impeachment.

A iniquidade de Crivella na Bienal pedia um tiro de canhão, um grito, um basta. Felipe sacou isso.

Onde está Fernando Haddad, por exemplo?

O descompasso do principal adversário de Bolsonaro nas eleições, provável candidato do PT à presidência em 2022, com as ruas se estampa em sua coluna na Folha.

O assunto da de hoje é o seguinte: “Se misturadas, política e religião produzem conflitos sociais duradouros e de difícil reversão”.

Não diga.

O da semana passada era “corrupção”.

“A Operação Lava Jato, nem de longe, detém o monopólio da virtude”, escreveu ele, a essa altura do campeonato. Puts grila, Batman!

(Mais um pouco e chegamos a Merval Pereira, que descobriu há uma semana que o presidente “começa a dar sinais de governar em benefício próprio”).

Em seu canal do YouTube, só convidados velhos, com ideias batidas, em conversas nefelibatas.

Quem merece uma hora de papo furado amigo com Eugênio Bucci, Antonio Prata ou Laura Carvalho?

Felipe Neto tem, obviamente, uma liberdade de ação que políticos não têm.

Mas o que ele pode ensinar é velho como o tempo: você não despreza um cavalo selado passando à sua frente.

É o caminho para retomar a consciência da sociedade brasileira.