O que aconteceria com a Veja se ela cometesse seus crimes nos Estados Unidos? Por Paulo Nogueira

Atualizado em 31 de julho de 2015 às 14:50
Nenhum compromisso com os fatos
Nenhum compromisso com os fatos

 

Foi anunciada hoje a demissão do diretor de redação da Rolling Stone americana, Will Dana.

O motivo foi o erro monumental da revista ao dar uma matéria sobre um pretenso estupro grupal sofrido por uma aluna da Universidade de Virgínia.

A reportagem teve uma repercussão instantânea e extraordinária.

A universidade e seus dirigentes foram imediatamente vítimas de manifestações furiosas porque, segundo o relato, foram omissos ao lidar com o caso.

O problema é que logo os fatos mostraram que o artigo da RS tinha enormes buracos. Tinha se baseado, essencialmente, numa fonte – a alegada vítima.

O episódio gerou um enorme debate nos meios jornalísticos americanos. A revista reconheceu publicamente seu fracasso, e retirou o texto do site.

Em seu lugar, colocou uma quilométrica análise produzida pela consagrada escola de jornalismo Columbia, a pedido da própria RS.

Na análise, foram esmiuçados todos os erros cometidos pela revista.

A queda do diretor de redação ocorre no momento em que várias ações na Justiça correm contra a revista por causa dessa reportagem.

Numa delas, a reitora da universidade reivindica 7,5 milhões de dólares de indenização por danos à imagem e reputação da escola e dela mesma.

As cifras nos Estados Unidos são altas para obrigar a mídia a tomar cuidado  antes de publicar denúncias.

É uma história exemplar a da RS para nós, brasileiros.

Compare com o que ocorre no Brasil, e particularmente com a Veja.

Numa única edição, a revista cometeu dois crimes jornalísticos, um deles infinitamente pior do que o da RS. Foi o que anunciou uma delação premiada que simplesmente não existia.

Sequer os advogados do personagem foram ouvidos pela Veja, como se viu antes mesmo de a revista chegar às bancas. Um deles disse que largaria a defesa caso seu cliente recorresse à delação.

Isso quer dizer: não houve o menor esforço para verificar a qualidade da informação que alguma fonte maligna passou para a Veja.

O segundo crime foi contra Romário, a quem atribuíram uma conta secreta milionária na Suíça que era falsa.

Romário teve que ir à Suíça para checar a veracidade da informação, e constatou que era tudo fajuto. Mais uma vez, ninguém checou.

Esse tipo de procedimento tem nome: crime.

A Rolling Stone vive um pesadelo. E a Veja está na maior tranquilidade.

Ou eles estão errados nos Estados Unidos ao exigir seriedade e precisão da imprensa ou nós é que estamos.

Faça a escolha.

A Veja estaria morta, há muito tempo, com este tipo de comportamento. Melhor: não teria a menor condição de se estabelecer no mercado americano.

O editor da RS perdeu o cargo. Fatalmente a revista pagará milhões de dólares em indenização.

No Brasil, o diretor de redação da Veja permanece firmíssimo em sua posição. Não há perspectiva de punição pela Justiça, tradicionalmente dominada pelas grandes corporações de mídia.

Para a sociedade, é um horror.

Como disse Mark Twain, há muitas leis para proteger a liberdade de expressão. Mas, no Brasil de 2015, não há uma única lei que proteja as pessoas da imprensa.