O que está por trás da disputa entre João Doria e Andrea Matarazzo no PSDB. Por José Cássio

Atualizado em 24 de janeiro de 2016 às 10:45
doria matarazzo
Doria e Matarazzo

 

O que o publicitário João Dória Junior e o vereador Andrea Matarazzo têm em comum?

Ambos pertencem a famílias tradicionais de São Paulo, são ricos, bonitos, frequentam os Jardins e têm uma trajetória de vida ligada ao PSDB. Pleiteiam a vaga de candidato a prefeito pelo partido na eleição de outubro. Se tudo correr como combinado, no domingo, 28 de fevereiro, quase duas dezenas de milhares de filiados de 58 diretórios zonais se apresentam para escolher um dos dois. Ao vitorioso caberá a tarefa de comandar a campanha visando retomar o controle da maior cidade do país e com isso fortalecer o partido para a disputa do poder central na eleição de 2018 – quando provavelmente terá de enfrentar Lula.

O PSDB sabe que vencer em São Paulo é um passo importante para recuperar a cadeira hoje ocupada por Dilma Rousseff. Mas as divergências internas, o jogo de interesses e o total descompromisso dos líderes tucanos com princípios elementares de ideologia e organização coletiva podem por tudo a perder. A ponto de que até as previas estão ameaçadas.

A se levar em conta o histórico do partido, João Dória e Andrea correm o risco gastar lábia e sola de mocassim italiano à toa. Mesmo cultuadas, previas para escolha de candidatos a cargos majoritários em São Paulo são “lenda”, para usar uma expressão consagrada pela militância. Os embates iniciam, o jogo é jogado, os apoios pedidos, mas na hora h, para ser exato na madrugada de sábado para domingo antes da abertura do processo, a votação é “melada” e os escolhidos são anunciados conforme conveniências particulares de um pequeno grupo de caciques, à revelia da maioria e no melhor estilo quem pode mais chora menos.

Mas não se deve rotular de ingênuo quem acredita que o jogo de cartas marcadas desta vez vai ter um desfecho diferente. O desgaste da fórmula, aliado à incapacidade de manter uma unidade mínima, levou o partido a um nível de fragilidade tal que alguns julgam improvável a repetição do conchavo.

Os líderes do PSDB abusaram da estratégia de usar seus militantes para fazer jogo de cena, “vendendo” a ideia de um partido que tem um pé no movimento popular quando na verdade conta mesmo é com setores de classe média que dizem odiar a política e na hora de votar escolhem os que costumam chamar de “menos piores”.

Tudo era fácil até a eclosão dos movimentos de massa surgidos em junho de 2013 e que se intensificaram nos anos seguintes. Esses movimentos levaram a ascensão de centenas de milhares à militância política, a tal ponto que o PSDB hoje tem de dividir os antigos apoios com grupos novos que melhor catalisaram o sentimento de mudança e trazem o partido à reboque das suas articulações.

Para ficar num único exemplo, apenas o Movimento Brasil Livre (MBL), do jovem Kim Kataguiri, pretende lançar 123 candidatos em 23 estados, distribuídos por PSDB, Partido Novo, DEM, PSD, PSC e PPS. Os demais movimentos que se notabilizaram pedindo o impeachment de Dilma seguem pelo mesmo caminho. Resultado: apoios antes garantidos agora estão espalhados por dezenas de outras correntes.

Conscientes ou não dessa realidade, João Doria Júnior e Andrea Matarazzo se transformaram no que se pode chamar de mal necessário. A dupla virou instrumento para o partido tentar algo diferente – e a partir disso recuperar o espírito de grupo e potencializar o exército de militantes espalhados por todas as regiões da cidade. Bater chapa é, na opinião de muitos, a melhor opção nesta altura do campeonato.

Na disputa pelos votos, por contar com o apoio do governador Geraldo Alckmin, João Dória larga na frente. No seu estilo mascate de interior, Geraldo adora circular pelos bairros, tomar café em padaria e jogar conversa fora. Nessas andanças, arrasta centenas, milhares de seguidores. E aproveita para mandar os seus recados. Se de fato assoprar que o publicitário é o seu preferido, a chance de vitória é uma quase certeza.

Andrea tem respaldo da dupla FHC-Serra e apoios importantes na Câmara de vereadores. A favor dele, um considerável conhecimento da cidade e a boa presença como líder da oposição ao prefeito Fernando Haddad. Se João Dória paga o preço por ser um neófito nos meandros da política, Andrea se ressente de mais apoios no andar de baixo, dado que simpatia e ele não costumam conviver numa boa.

A sorte tucana em 2016 está lançada. Pela motivação dos dois grupos e pelo que garante o comando da executiva municipal, o partido vai escolher por meio do voto direto o seu candidato a prefeito. Seria sem dúvida uma quebra de paradigma e uma demonstração de maturidade.

A dúvida é saber o que pode ocorrer caso, novamente, os interesses particulares prevaleçam e os nomes sejam conhecidos na hora que os filiados aparecerem para votar na manhã de domingo.

O deputado federal Ricardo Trípoli também se diz candidato. De forma discreta, talvez tentando se beneficiar de um possível acordo de bastidores, com seu nome aparecendo como opção de terceira via.

Há outros que gostariam de representar esse papel. Por enquanto, porém, por mais que se possa criticá-los, quem está no páreo são Andrea Matarazzo e João Doria Júnior. A despeito do perfil quase idêntico, estão agindo de forma nunca antes vista na história do PSDB: dando a cara à tapa, correndo atrás. E isso não deixa de ser um mérito.