O raro luxo da insatisfação dos ricos

Atualizado em 25 de setembro de 2025 às 13:24
Lula em pronunciamento nacional. Foto: reprodução

A nova fotografia do humor nacional, oferecida pela pesquisa Pulso Brasil-Ipespe, trouxe esta manhã mais um sopro de ânimo na luta contra o fascismo local. Segundo os números, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva viu sua aprovação subir de 43% para 50%, enquanto a desaprovação recuou de 51% para 48%. Até aqui, nada além do balanço habitual das marés da opinião pública. Mas, por trás desses percentuais, escondem-se nuances que merecem ser degustadas com vagar, alegria no coração e sorriso largo no rosto.

Primeiro, há a constatação de que a popularidade de Lula se consolida cada vez mais entre os seus: 95% dos eleitores de esquerda o aprovam. Não é apenas fidelidade ideológica. É a demonstração de que o esforço de erosão movido por figuras como Ciro Gomes, Jones Manoel e congêneres fracassou em sua obstinação de rachar o campo progressista. Em política, poucas coisas são tão raras quanto a contenção bem-sucedida de dissidências inflamadas. Hoje, temos uma. Consolidou-se uma barragem. Como diria uma tia pentecostal da vida: “vade retro, satanás, o sangue de Jesus tem poder!”

Em paralelo, a pesquisa nos presenteou com uma pequena comédia involuntária, dita com pompa, circunstância e, pasme, longe de Paris. O próprio Ciro Gomes anunciou que não será candidato em 2026. Declarou que não deseja mais “importunar os eleitores”. Afirmações de Ciro, como se sabe, possuem o mesmo valor de uma fala de seu contraparte alaranjado. Assim, convém registrar o falso anúncio com o mesmo convencimento com que se recebe uma promessa de dieta feita na noite de Natal, ou o célebre juramento de que “amanhã eu garro na musculação”. Todos sabemos a solidez de tais compromissos.

Mas há duas notícias ainda melhores, ao gosto exibicionista da degustação, ambas carregadas de sabores, aromas, lágrimas, corpos, estruturas e retrogostos especiais. A primeira: a consolidação do apoio entre o eleitorado de centro, que já aprova mais do que reprova a atual gestão (49% contra 45%). É como se o campo intermediário, tantas vezes instável, tivesse enfim encontrado um ponto de equilíbrio razoável. A segunda — e aqui reside a explosão de todos os elementos organolépticos da degustação, do levantamento — é que 84% dos mais ricos desaprovam o governo.

Foto: Reprodução/CNN

Eis o milagre das estatísticas. Números que, para alguns, seriam motivo de lamento, para nós, que desejamos um mundo melhor para todos, é a melhor notícia do dia. Se os de cima estão contrafeitos, é sinal de que alguma coisa no chão da política ainda preserva seu sentido. Nada conforta mais um coração solidário do que perceber que aqueles acostumados a moldar o país à sua imagem continuam desconfortáveis com um governo que insiste em lhes escapar ao controle.

Seria pueril interpretar tal dado como prova de virtude absoluta; trata-se antes de um sintoma. O incômodo dos endinheirados não decorre de caprichos pessoais, mas de um rearranjo de prioridades: programas sociais robustos, valorização do salário mínimo, investimentos públicos em áreas que não lhes rendem dividendos. Em suma, políticas que não lhes foram feitas sob medida.

Há, portanto, uma ironia escondida nesta fotografia da opinião nacional: quanto mais o governo Lula reconquista o apoio popular, mais se amplia o fastio das elites. Eis a potência da cifra negativa em 84%. Não existe indicador mais fiável de vitalidade democrática do que a insatisfação dos que sempre estiveram acostumados a mandar sem ser contrariados.

Degustemos. A boa nova do dia não é apenas a recuperação da aprovação presidencial, nem a momentânea rendição de um Ciro cansado de si mesmo. A melhor notícia é outra, singela e saborosa: os endinheirados seguem infelizes com o governo.

Enquanto eles franzem o cenho, a maioria respira.
Enquanto eles se inquietam, a esperança viceja.
E isso, num país tão acostumado ao inverso, é um luxo raro.