O que está por trás do plano adiado de Kassab de limitar a banda larga. Por Zambarda

Atualizado em 14 de janeiro de 2017 às 9:00
Kassab
Kassab

 

“Dona Marta quer internet com antena! Mas não diz quanto vai custar! Normalmente quando ela inventa vem aí uma taxa pra pagar! Taxa de Antena? Agora, São Paulo já sabe! Pra fazer do jeito certo o prefeito é Kassab”.

Esse era o jingle do candidato no ano de 2008 contra Marta Suplicy, na época no PT.

Se Gilberto Kassab, “que não é nem de esquerda e nem de direita”, era contra as taxas da ex-prefeita, em 2017 ele resolveu apoiar o aumento de taxas para agradar o governo Michel Temer e a Agência Nacional de Telecomunicações, a Anatel.

A agência representa as operadoras que fornecem acesso à internet, como Vivo (antiga Telefônica), Claro, Oi e TIM. Sucateada, a Anatel chegou a ficar apenas com R$ 14 em caixa e quase encerrou suas atividades em 2016.

A subutilização do órgão regulador o transformou num balcão de negócios das operadoras de telefonia que fornecem conectividade online. Entre todas, a Vivo é a maior delas, sendo a representante da privatização da extinta Telesp.

Corrompida por teles que estão interessadas em lucrar mais com o acesso à internet, a Anatel travou uma disputa contra o Comitê Gestor da Internet (CGI.br) na formalização do Marco Civil a Internet.

Construído como uma “constituição” para impedir crimes e irregularidades online, o Marco Civil teve como relator o deputado Alessandro Molon, da Rede. Na oposição, o ex-deputado Eduardo Cunha agiu como lobista da Anatel e das teles. Em sua prestação de contas de campanha, consta que Cunha recebeu quase R$ 1 milhão da empresa Telemont Engenharia em 2014, que fez projetos conjuntos com a Vivo para a Cisco.

A briga entre a Anatel e o CGI.br foi a respeito do artigo sobre a “Neutralidade da Rede”, que exige acesso igual a redes como Facebook ou YouTube para não limitar o acesso de internet ou tornar seus serviços mais caros, em prol da democratização da conexão. As teles argumentam  junto com a agência que precisam cobrar tarifas e taxas diferenciadas para melhorarem seus serviços.

O Comitê Gestor e representantes da sociedade civil brigaram para transformar em lei um código que defenda a democracia de acesso. O CGI.br venceu a briga e, em 2014, a então presidente Dilma Rousseff sancionou o Marco Civil da Internet com a clausula de neutralidade.

Três anos depois o assunto volta à tona com o ministro de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações do governo Michel Temer, Gilberto Kassab, defendendo a Anatel e, portanto, as telecomunicações. “O nosso objetivo é beneficiar o usuário [ao limitar o acesso à internet] no segundo semestre de 2017”, disse Kassab ao jornalista Fernando Rodrigues no dia 10 de janeiro.

O ministro de Temer repete exatamente o mesmo discurso dos defensores da Vivo e de outras operadoras há pelo menos sete anos. Criam-se taxas novas para supostamente melhorar a qualidade da conexão online.

A estratégia, no entanto, não cola.

Na sexta-feira (13), o grupo hacker Anonymous vazou dados pessoais em retaliação às declarações ministro Kassab. Com o estardalhaço, ele voltou atrás nas declarações no mesmo dia.

A insatisfação dos usuários não é por acaso acaso. O governo Temer abriu mão de investir entre R$ 20 a R$ 100 bilhões em infraestrutura para melhoria das conexões em rede. Em teoria, os investimentos seriam repostos pelas teles até 2025, o que justificaria o aumento de preço das tarifas.

No entanto, antes do desinvestimento, o Brasil já era o nono país com pior banda larga do mundo em 2014. Com 2,9 Mbps/s em média, ficamos atrás somente de Bolívia, Paraguai, Venezuela, Índia, Costa Rica, Indonésia, Filipinas e Panamá. A Coreia do Sul tem dez vezes mais a nossa velocidade, graças à expansão das conexões de alta velocidade em fibra ótica.

Por este motivo, e para lucrar mais, a Anatel tentou em 2016 aumentar as taxas de conexão. Afirmou que fãs de jogos online “gastam muita internet”, embora os games consumam 20 MB por hora enquanto vídeos na internet chegam em 150 MB. Criticada pelo público e por especialistas, a Anatel tentou criar limitações na internet em abril de 2016 e recuou na decisão em junho.

A hesitação, no entanto, é puro blefe. A Anatel e as teles tentam piorar e encarecer a conexão de internet do brasileiro desde o tempo de Eduardo Cunha, fruto da privatização escandalosa e corrupta dos anos de FHC no poder.

Agora, as telecomunicações tentam empurrar seu projeto de taxas através do ministro Kassab. O mesmo que combatia a “Martaxa” há nove anos.