O Salão dos Rejeitados

Atualizado em 17 de janeiro de 2013 às 15:00

Todo mundo – sobretudo artistas – que se sentiu rejeitado deveria conhecer a história seguinte.

Este quadro foi objeto de riso no Salão dos Rejeitados

No começo dos anos 1860, um grupo de jovens pintores franceses era tratado com desdém pelo alto mundo da arte parisiense.

Suas obras não conseguiam quase nunca lugar no Salão da Arte, dominado pelo pensamento conservador.

Para eles foi montado então, em 1863, o Salon des Refusés. Salão dos Rejeitados.  Ali eles puderam exibir seu talento. Era uma mostra paralela à oficial. Uma curta distância as separava.

Quem criou a exposição paralela foi o imperador Napoleão III, inconformado com os critérios de escolha que vinham sendo adotados. (Napoleão III seria imortalizado por Marx na conhecida frase segundo a qual a história se repete como farsa. Marx comparava os dois Napoleões, o real e o sobrinho. Este levaria a França a uma guerra devastadora com os alemães em 1870. Paris foi destruída e o imperador destronado.)

No primeiro Salão dos Rejeitados uma obra provocou escárnio. As pessoas olhavam e riam. Alguns vaiavam.

O que era aquilo? Alguém podia explicar, por favor?

Eram duas mulheres, uma nua e a outra em parte, e dois homens, comendo num gramado. A mulher no segundo plano parecia estar amamentando, mas não era possível afirmar com certeza. Era o Desjejum na Grama, de um pintor iniciante, de pouco mais de 20 anos.

Edouard Manet.

Ele próprio testemunhou, incógnito no meio da multidão, os risos destinados a seu quadro. Depois de um momento de orgulho ferido, ele achou que havia razão em parte nos apupos. Ele gostou das árvores, gostou sobretudo da mulher do primeiro plano. Mas os homens não estavam bem. Um deles estava sentado numa posição inexequível.

Como Manet lidou com as críticas está relatado num romance de Emile Zola, “A Obra”.  Nele Manet aparece como Claude, e ele próprio, Zola, como Sandoz, um jovem jornalista. São grandes amigos na ficção, assim como eram na vida real.

Manet e os amigos saíram do salão e foram tomar cerveja. Manet falava entusiasmadamente do futuro, tanto que ficou três horas sem tocar em sua cerveja.

A inovação, sabia ele, estava no Salão dos Rejeitados. Não no outro.

“Riam, imbecis de Paris”, disse ele. “Nós vamos conquistar vocês.”

Conquistaram.

Zola quis levar Manet para jantar na casa de sua mãe depois de saírem do bar.

Manet disse que estava com dor de cabeça.

E foi atrás da mulher que servira de modelo para seu quadro vaiado. Ela, a do primeiro plano.

Este texto foi publicado no Diário do Centro do Mundo em 02 de março de 2011.