O triunfo do filme Pantera Negra e o racismo sempre vivo. Por Marcos Sacramento

Atualizado em 26 de fevereiro de 2018 às 18:16
T’Challa, o primeiro herói negro em um filme da Marvel, interpretado por Chadwick Boseman

O sucesso do filme Pantera Negra é inquestionável. Em dez dias, a história do super-herói negro da Marvel faturou 400 milhões de dólares nos Estados Unidos e mais 304 milhões nos demais países.

No Brasil e no exterior, grupos ligados ao movimento negro reuniram multidões para ver o primeiro blockbuster da Marvel escrito, dirigido e estrelado quase totalmente por negros.

Os jogadores Adam Lingard e Paul Pogba, do Manchester United, comemoraram os gols da vitória contra o Chelsea com a saudação do povo de Wakanda, país fictício do herói Pantera Negra.

Todo esse sucesso merece ser celebrado. O filme traz a história de um herói africano sem se prender a estereótipos direcionados ao povo negro. T’Challa, alter ego do Pantera Negra, é rei de Wakanda e além de força e habilidade é dono de inteligência excepcional.

O país que ele governa é próspero, tecnologicamente avançado e com uma mulher à frente das inovações científicas.

Essas referências a igualdade racial e empoderamento feminino, combinados a elementos de tradições e mitologias africanas fazem de Pantera Negra um filme ímpar, um marco em uma indústria ainda hoje marcada pelo predomínio de rostos brancos e ideias eurocêntricas.

Mas houve quem se sentisse incomodado.

Um grupo de fãs da Disney, proprietária da Marvel, promoveu um mutirão para avaliar o filme negativamente no site Rotten Tomatoes. O evento criado para isso no Facebook reuniu 3.700 usuários confirmados e 1.800 interessados em dar notas baixas a Pantera Negra, antes mesmo do filme estrear nos cinemas.

Outros desocupados infestaram o Twitter com notícias falsas de agressões de negros contra brancos que teriam ido ver o filme, com direito a fotos chocantes para deixar a mentira mais dramática.

Houve inclusive acusações racismo reverso, como a sofrida pela estudante de pedagogia Vitória Sant’Anna, idealizadora de uma campanha para levar 210 crianças negras e moradoras da periferia de Porto Alegre para ver o herói T’Challa.

A raiz dessas manifestações é uma só: o racismo.

Só ele justifica o ataque a uma obra de entretenimento capaz de agradar a qualquer pessoa independente da etnia, cujo predomínio de negros no elenco deve-se apenas ao fato de que o Pantera Negra é africano e a maior parte da história se passa na África.

Pantera Negra poderá sinalizar um novo momento na indústria cinematográfica, com mais negros na frente e atrás das câmeras. Mas as reações mostram que não são poucos os incomodados.

Se de um lado o grito “Wakanda Forever” ganha o mundo, do outro o slogan “white power” continua presente. Com tantos inimigos à solta, o sucesso de Pantera Negra deve sim ser comemorado, mas sem a ilusão de que o racismo vai deixar de incomodar.