O vitimismo do padre bolsonarista Paulo Ricardo, monitorado pelo STF. Por Romero Venâncio

Atualizado em 3 de setembro de 2022 às 8:31
Padre Paulo Ricardo posa com armas ao lado de Olavo de Carvalho nos EUA

Por Romero Venâncio, professor da Universidade Federal de Sergipe, especialista na extrema direita católica

Começando por onde deve-se começar: não é a Igreja Católica que está sendo monitorada no processo das “fake news” coordenada pelo ministro do STF Alexandre de Moraes e nada do que ocorre aqui com o padre Paulo Ricardo é semelhante ao que está acontecendo na Nicarágua atual. 

Separemos as coisas e os fatos. Restrição e monitoramento dos canais e contas do padre Paulo Ricardo não se enquadram como censura. O problema é não querer ver os reais motivos pelos quais seus canais de comunicação estão sendo vigiados, monitorados, por conta de disseminação de fake news e discurso de ódio, já percebidos a muito tempo e enquadrados contra a constituição. 

Trata-se de vitimismo promovido e calculado (no sentido exposto por Jason Stanley no seu “Como funciona o fascismo”) da parte dos “discípulos” do padre para justificar as ações dele e de seus seguidores nas redes sociais. Que ironia da história! Uma extrema direita religiosa reivindicar “liberdade de expressão”. 

Por que ironia? Pelo seguinte motivo: a defesa de liberdade expressão vem da tradição liberal, a mesma tradição atacada pelo padre e os grupos de extrema direita dentro do catolicismo. E ironia é o que não falta neste delirante mundo dos defensores da “liberdade de expressão sem limite”. 

Nesse quesito, o dito padre de extrema direita encontra-se com o PCO. Tô esperando a live de Rui Costa Pimenta e padre Paulo Ricardo sobre liberdade de expressão.

Estudo a extrema direita católica e suas ações nas redes sociais desde 2013 e afirmo categoricamente que o debate político-jurídico sobre os canais de extrema direita no Brasil chega tarde. 

Vamos aos fatos: virou “liberdade de expressão” atacar pessoas LGBT, atacar religiões de matriz africana, atacar socialismo, alimentar o anti-petismo, defender torturador(es) da ditadura de 1964, ridicularizar instituições da já pálida democracia, pontificar contra vacinas, passar pano para os palavrões e para nicotina de Olavo de Carvalho, mentir descaradamente sobre teologia da libertação ou sobre o Papa Francisco. 

Ora, quando o padre Julio Lancellotti é impedido por forças policiais ou milícias de direita de fazer seu trabalho com os pobres em situação de rua, onde estão os “paladinos da liberdade de expressão”? Uma primeira conclusão a que chegamos é a seguinte: “liberdade de expressão” na boca dessa gente é seletiva. É “liberdade de expressão” deles.  

Só entenderemos a prática da extrema direita católica nas redes se entendermos uma coisa: os olavistas usam a democracia como direito pra deslegitimá-la em última instância. “Liberdade de expressão” na boca dessa extrema direita católica é usada para justificar sua ideologia nas redes sociais. 

Alguns temas defendidos com rigor: o anti-modernismo, contra vacinas, impropérios contra o concílio vaticano II, ofensas ao Papa Francisco, espalham essa mentira chamada “ideologia de gênero” (com o intuito de atacar as populações LGBT), defendem uso de armas (vejamos a foto de padre Paulo Ricardo com um fuzil de longo alcance ao lado de Olavo de Carvalho) e toda a cultura bolsonarista movida pelo discurso de ódio. Tudo em redes sociais. 

Usam-se os meios mais avançados para disseminar as ideias mais reacionárias. O que o ministro Moraes está monitorando é isto. Não se trata de perseguição ao padre. Longe disso. Trata-se de monitoramento do que ele fala em redes sociais e que se torna ofensa e discurso de ódio contra instituições democráticas.