Obras sem licitação, atrasos e indícios de irregularidade: a verdadeira gestão Tarcísio

Atualizado em 11 de setembro de 2022 às 20:47
Tarcísio Freitas em retomada de obras da BR-156 no Amapá
Foto: Marcos Brandão/Senado/Divulgação

O candidato ao Governo de São Paulo Tarcísio de Freitas (Republicanos) foi apelidado de “Tarcisão do asfalto” por aliados, que propagam discurso de retomada de obras e eficiência. Na reta final de sua gestão como ministro da Infraestrutura de Jair Bolsonaro (PL), Tarcísio passou a avançar nos gastos com dispensas de licitação. Os pagamentos incluem contratos com indícios de irregularidades apontados pelo TCU (Tribunal de Contas da União) e obras emperradas. As informações estão em extensa reportagem do jornal Folha de S. Paulo publicada neste domingo (11).

Os gastos sem licitação no Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), autarquia ligada à pasta que cuida das rodovias, saíram em valores nominais de R$ 224 milhões, em 2019, para R$ 421 milhões, em 2020. Em 2021, atingiram R$ 1,1 bilhão, segundo o Portal da Transparência —alta de quase 400% em dois anos.

As dispensas de licitação incluem três contratos de empresas diferentes para cuidar de um mesmo trecho e verba para uma construtora que foi alvo da Polícia Federal sob suspeita de fraude no próprio Dnit. Há ainda obras emergenciais fora do padrão, por se estenderem por quase 200 km de estrada, não em trechos pontuais. Apuração do TCU aponta problemas como início de obra sem projeto básico completo e sem considerar períodos de chuvas.

A BR-156, que cruza o Amapá, tem um pouco desses ingredientes. Relatório do TCU afirma que os serviços para pavimentação do trecho norte da rodovia foram iniciados em 2019 com projeto incompleto, o que levou ao atraso da obra, que está com pouco mais de 10% de avanço.

O ex-ministro argumentou à Folha que o aumento nas dispensas de licitação ocorreu devido ao excesso de chuvas e ao menor orçamento para manutenção de estradas. Ele afirmou ainda ter garantido a trafegabilidade nas vias e priorizado a retomada de obras paralisadas e disse acreditar que as irregularidades citadas por técnicos do TCU serão revistas pelos ministros da corte.

Na gestão do ministro, o Dnit teve redução dos investimentos. Por outro lado, gastos sem concorrência em aceleração podem ser indícios de má gestão e brechas para irregularidades, afirmam especialistas.

Outra irregularidade é que o cronograma de asfaltamento não levou em conta a impossibilidade de trabalhos no período de chuvas. A rodovia foi visitada por Tarcísio no início da gestão Bolsonaro, em 2019, para o anúncio da retomada das obras. Na ocasião, o hoje candidato ao Governo de São Paulo disse que “os amapaenses costumam falar que essa é ‘a obra parada mais antiga do Brasil'”.

Tarcísio justificou as obras emergenciais principalmente por duas razões: excesso de chuvas e menor orçamento do governo para serviços de manutenção das estradas. “Infelizmente, para aquilo que é administração direta, o orçamento caiu muito. A gente pegou dois anos de pandemia, fomos muito prejudicados. O que a gente tinha nós aplicamos quase na integralidade.”

Além do acordo de pavimentação do trecho, que se arrasta desde 2017, o Dnit assinou na gestão de Tarcísio outros dois contratos que envolvem o segmento norte da BR-156. Um deles é de obras de manutenção, parte do programa de conservação Pato (Plano Anual de Trabalho e Orçamento). Porém, para o mesmo trecho da rodovia foi assinado um acordo emergencial. Ponto que chama a atenção é a extensão da obra considerada urgente, que atinge 110 km.

A beneficiada com a dispensa de licitação foi a empreiteira LCM, em um contrato de R$ 40,5 milhões. Em 2019, a construtora mineira esteve no centro da Operação Mão Dupla, da Polícia Federal e de outros órgãos, em Rondônia, na qual foram presos funcionários do Dnit e da LCM. A ação citou fraude na medição e no pagamento de obras de pavimentação. A defesa da companhia argumentou, porém, que os contratos eram regulares.

O guia de contratações do Dnit diz que obras emergenciais só devem acontecer em casos excepcionais, como deslizamentos de terra ou quedas de pontes. Já a chuva seria um fator mais previsível —o Amapá, por exemplo, está está no topo do índice de intensidade de chuvas médias que é usado pelo Dnit.

O Dnit, por sua vez, afirmou em nota que a lei prevê a utilização das dispensas de licitação em casos de emergência ou calamidade pública, sobre contratos sobrepostos para a mesma rodovia, cita que cada um atende a situações específicas.

“É um problema de gestão deixar que problemas nas rodovias se agravem para caracterizar uma futura emergência. Os índices pluviométricos hoje são de conhecimento de todos, e se antecipar às chuvas e aos danos que delas pode advir é o que se espera de um gestor público diligente”, afirma o presidente do Ibraop (Instituto Brasileiro de Auditoria de Obras Públicas), Anderson Uliana Rolim. “Os Tribunais de Contas já avaliaram diversas contratações emergenciais em que, ao fim, foi detectada uma situação em que a emergência foi ‘fabricada’, ou seja, na omissão ou na ação equivocada da administração, a obra precisou, no limite, ser contratada sem licitação”.

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