Os evangélicos que seguem Bolsonaro sentem-se atraídos pela apologia à tortura? Por Hermes Fernandes, pastor

Atualizado em 6 de outubro de 2018 às 6:55
Malafaia na UTI com Bolsonaro

Publicado no Facebook do pastor Hermes Fernandes

Parafraseando uma das canções que expressaram o descontentamento da minha geração com o seu país, pergunto: Que igreja é essa?

Em adesão à campanha de Bolsonaro, o pastor José Wellington, presidente da maior convenção das Assembleias de Deus do Brasil disse diante de sua igreja lotada que o presidenciável tem tido o apoio dos evangélicos porque diz aquilo que eles gostam de ouvir. Isso foi dito após ter sido projetado no telão da igreja um vídeo em que Bolsonaro agradece o apoio da denominação.

Afinal, o que há em seu discurso que seja tão palatável ao povo evangélico? Será que o povo que diz seguir os ensinos de Jesus sente-se atraído pela apologia à tortura? Será que o que lhes apetece é o linchamento das minorias, impondo-lhes que se submetam às maiorias? Será seu discurso anti-corrupção igualmente presente nos lábios de tantos outros como Fernando Collor de Mello?

Na verdade, tudo isso vem no combo. Mas o que atrai mesmo é o aspecto moralista de seu discurso. Ele é contra o kit gay, a erotização infantil, o aborto, o homossexualismo (SIC); mas é a favor da família tradicional. Tão a favor que já está no terceiro matrimônio.

Seria isso suficiente para ofuscar o fato de ele ser contrário aos direitos trabalhistas? Ora, ser contra tais direitos não seria o mesmo que ser contra a família? Como o trabalhador poderá mantê-la dignamente sendo delapidado de seus direitos? Como poderá oferecer um Natal digno aos seus filhos se lhe tirarem o décimo terceiro e as férias?

Essa estorinha de kit gay e erotização infantil é a maior baboseira dentre todos os fake news vociferados dos púlpitos hoje em dia. Faz-se um terror para convencer os crentes a votarem contra si mesmos. O MEC desmentiu isso faz tempo.

Quando meu saudoso avô era pastor das Assembleias de Deus, os crentes gostavam mesmo era de ouvir testemunhos de gente egressa do crime e que havia se tornado nova criatura. Hoje preferem ouvir coisas do tipo “bandido bom é bandido morto”.

Quando jovem, lembro-me das vezes em que acompanhei minha mãe suas visitas aos presídios. Sempre encontrávamos irmãos de outras igrejas lá, levando a Palavra e se solidarizando com o sofrimento dos detentos. Hoje, muitos irmãos fazem apologia à tortura. Outros reivindicam a aplicação de pena de morte no país. E ainda há os que defendem a redução da maioridade penal.

Em que a igreja evangélica se tornou nos últimos anos! Por isso o fascismo encontrou nela o cúmplice perfeito para levar avante sua agenda higienista e eugenista.

Que igreja é essa? Uma caricatura grotesca da verdadeira igreja de Cristo que subia os morros, alimentava os famintos, recuperava viciados, aterrava abismos entre as classes sociais e transformava a sociedade agindo como sal da terra e luz do mundo. Aquela igreja era a cara do Messias.

Mas essa igreja caricata que comprou o discurso fascista tem o “messias” que merece. Ela é, por assim dizer, sua imagem e semelhança.