Padilha, a série sobre Marielle e as justificativas cínicas de Antonia Pellegrino. Por Luis Felipe Miguel

Atualizado em 8 de março de 2020 às 19:20
Marielle Franco

Publicado originalmente no perfil de Luis Felipe Miguel

As justificativas de Antonia Pellegrino mergulham no cinismo

Ela diz que Padilha “se arrependeu” do apoio a Moro. Bom, um ingênuo pode ter apoiado Moro e se arrependido. Acontece. Mas o apoio de Padilha incluiu fazer um seriado abertamente mentiroso, com o objetivo de criminalizar o PT, sincronizado com o calendário eleitoral. Não é coisa de ingênuo, de apoiador de boa fé. É coisa de canalha. Um “arrependimento” simples não dá conta disso não.

Ela diz que é “não punitivista”. Achei feio. Punitivismo não tem nada a ver com a história. Padilha não foi punido, nem será, pela falsificação mal intencionada que produziu. Podemos discutir se deveria (eu acho que sim). Mas em relação a ser chamado para dirigir uma obra sobre alguém que foi vítima daquilo que ele ajudou a legitimar e consagrar – bom, aí acho que há bem pouco o que discutir.

Ela diz que Padilha era uma das únicas opções que garantiriam mercado internacional para a série. Imagino que seja verdade. Mas esse é o ponto: vender o produto audiovisual baseado na vida de Marielle é mais importante do que ser honesto com sua trajetória?

Ela diz que viúva e família concordaram. Não duvido. Mas a questão não é jurídica, é política – é sobre a apropriação da memória de alguém que tornou-se o mais poderoso símbolo da resistência ao retrocesso no Brasil. Se a família de Nelson Mandela autorizasse um antigo propagandista do apartheid a rodar um filme sobre ele estaria tudo bem? Certamente não. Não sei o que motivou a anuência da família e da viúva, não sei se há valores envolvidos, mas, francamente, pouco importa. Padilha na direção é um escárnio à memória de Marielle.