Palestinocídio. Por Edward Magro

Atualizado em 19 de fevereiro de 2024 às 20:58
Garoto de costas com bandeira da Palestina
Foto: EPA

Por Edward Magro

A mídia brasileira está repercutindo integralmente, desde ontem, tudo o que é publicado pelo governo e pela diplomacia israelense acerca do discurso do presidente Lula, anteontem, na cúpula da União Africana em Adis Abeba, na Etiópia.

Como esperado quando se abre a porteira do não-jornalismo, colocou na boca do presidente Lula uma palavra que ele não disse no discurso: “holocausto”; e, de quebra, escondeu deliberadamente a parte em que Lula, num ato de profundo respeito ao martírio do povo Judeu, disse que “.. o que está acontecendo na Faixa de Gaza com o povo palestino não existiu em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu. Quando Hitler resolveu matar os Judeus”.

Colocar na boca do Lula o verbete “holocausto” tinha uma única finalidade: interditar a denúncia de que o Estado de Israel promove o extermínio do povo Palestino.

Na impossibilidade de negar a mensagem de extermínio que Lula trouxe, engordaram a mensagem com palavras não ditas para tentar desqualificar a denúncia.

Bobagem. O recado está dado e, por sinal, muito bem dado. A pressão foi duramente sentida pelo governo Netanyahu e, passadas quase 48 horas, nenhum governo do mundo, nem mesmo os EUA que financia e arma o exército israelense, disse um pio em favor do governo de Israel ou contra o Brasil. Silêncio olaviano.

Como rescaldo positivo, ao vocalizar o esperneio de Netanyahu e sua horda carniceira, a mídia brasileira prestou, sem querer, um enorme serviço ao esclarecimento do público não fanatizado: o presidente Lula tirou o véu midiático que protegia o governo de Israel e expôs a responsabilidade de Netanyahu na limpeza étnica do povo Palestino.

Lula colocou Netanyahu e seu bando de sanguinários nus, na planície. Não fosse isso, uma fala dita na distante Etiópia, teria sido escondida, abafada, como é usual.

Lula falando e gesticulando com expressão séria
Lula em discurso na cúpula da União Africana – Reprodução/Instagram

Numa tentativa de demonstração de força, hoje pela manhã, Israel Katz, recém-empossado ministro das relações exteriores de Israel, resolveu usar como cenário o Museu do Holocausto em Jerusalém para protagonizar uma cena bravateira exigindo um pedido formal de desculpas do presidente Lula.

A resposta veio rápido: Celso Amorim disse que “quem tem que pedir desculpas é Israel, e não é ao Brasil, mas à humanidade”; o embaixador de Israel no Brasil, o bolsonarista Daniel Zonshine, foi convocado pelo ministro Mauro Vieira para se explicar, ainda hoje, perante o governo brasileiro; e Frederico Meyer, embaixador do Brasil em Israel, embarca amanhã, de volta para o Brasil onde deve passar uma temporada.

Colocar o “holocausto” na boca de Lula não funcionou como o esperado, mas isso, neste caso. O normal é que o uso dos verbetes “holocausto”, “genocídio”, “nazismo” e “nazissionismo” funcionem como “carimbadores de antissemitas”. Neste caso, contra Lula, o carimbo não funcionou.

O sionismo é mestre no uso dessa “falácia argumentativa”, e como bom ilusionista de esquinas, mostra, esconde e mistura palavras, verbetes e termos, de modo aleatório e descontextualizado como método para vedar discussões e impor sua verdade – por mais mentirosa que ela seja -; qualquer pessoa que atrapalhe seus interesses e que, mesmo que lateralmente, tenha usado algum desses verbetes é imediatamente taxado de “antissemita”.

Para tentar neutralizar a manipulação sionista talvez seja necessário abandonar completamente o uso dessas palavras, qualquer que seja a circunstância.

Uma saída é substituí-las por um único verbete: “palestinicídio”. Termo já em uso mundo afora, descrito como “plano de extermínio total do povo Palestino, concebido, planejado e em execução desde 1948 pelo Estado de Israel”. O termo é claro, não deixa dúvida e tem a força de retirar da discussão os verbetes-mágicos que interditam a denúncia da limpeza étnica do povo Palestina perpetrado pelo Estado de Israel.

Se Lula tivesse usado “palestinicídio” em vez de dizer que há evidente “semelhança entre o extermínio do povo Palestino, por Israel, e o extermínio do povo Judeu, pela Alemanha nazista”, certamente a mídia o estaria acusando de outra coisa qualquer, mas não de antissemita.

O saldo final da querela é extremamente favorável a Lula. Nesta segunda-feira (19), todos os países da União Europeia, exceto a Hungria – hoje governada por um fascista -, pediram uma pausa humanitária imediata na Faixa de Gaza; e os EUA enviaram uma resolução para o Conselho de Segurança da ONU que propõe cessar-fogo na guerra entre Israel e o Hamas.

Não é possível vincular as decisões da UE e EUA ao discurso de Lula, mas que estão absolutamente conectados, não resta dúvida.

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