Publicado originalmente no Instituto Humanitas Unisonos
“O barco: não há conceito que represente melhor a ideia do nosso planeta. Um barco que navega no universo e nós o estamos pilhando por dentro. É um conceito da encíclica Fratelli Tutti com o qual um cientista só pode concordar”.
Roberto Cingolani, físico, 100% leigo, ex-diretor científico do Instituto Italiano de Tecnologia e hoje diretor da pesquisa de Leonardo, foi um dos convidados mais assíduos do Cortile dei Gentili: uma série de encontros entre cientistas e religiosos promovidos pelo Cardeal Gianfranco Ravasi.
A entrevista com Roberto Cingolani é de Elena Dusi, publicada por La Repubblica, 05-10-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis a entrevista.
Você se considera em sintonia com a encíclica?
Sim em vários aspectos, especialmente o da sustentabilidade. No mesmo navio estão os que ocupam a cabine da primeira classe, os que são encarregados dos serviços gerais e os que nem têm o que comer. Mas quando aparece uma falha, ou todos se salvam ou não se salva ninguém.
A pandemia seria a falha?
A pandemia tem muito a ver com nosso modelo de desenvolvimento descontrolado. Mas o discurso do Papa é mais geral. Sustentabilidade significa viver em uma casa sem comer suas paredes. Parar de se fixar no balanço do PIB e iludir-se achando que talvez esteja crescendo, sem perceber que o telhado tem buracos. Mais cedo ou mais tarde, teremos que nos preocupar com o telhado.
O Papa também falou sobre as vacinas e o compartilhamento dos cuidados.
Posso ser pessimista, mas não acho que veremos grandes exemplos de compartilhamento. Se tivéssemos um vírus que não mata 2% das pessoas, mas 20% ou 30%, todo mundo se fecharia atrás de seu muro e se manteria grudado em sua vacina.
No entanto, repetimos isso desde os tempos da AIDS: só podemos nos salvar das epidemias todos juntos.
A encíclica toca no ponto da memória: da importância de não esquecer as experiências passadas, como os massacres ou a bomba atômica. Infelizmente, porém, a espécie humana tem a lamentável característica de esquecer e, portanto, de repetir os erros. É uma das razões pelas quais persistimos em nossos comportamentos insustentáveis. A única maneira de evitar isso é nunca parar de estudar.
Outros valores que você compartilha?
O milagre da amabilidade, isto é, a aceitação do outro e do diferente. E a importância da superação dos muros, não só aqueles de tijolos, mas também aqueles de ódio que vemos, por exemplo, nas redes sociais e que limitam a biodiversidade da espécie humana.
A ciência laica e a religião compartilham muito mais do que parece.
Só até certo ponto, é claro. Alguns argumentos levantados pelo Papa não são apenas cristãos, são universais. Acrescentaria também o tema do perdão, que significa não se vingar, mas sem remover da memória. E que, segundo uma leitura ainda mais sofisticada, torna-se um convite a ser justos até mesmo com quem não o merece. O perdão, junto com a memória fruto do estudo e com a amabilidade que supera os muros, sustenta o modelo de sociedade que nos inspira. Um modelo muito diferente daquele atual, eu percebo.
Nesse sentido, leigos e religiosos estão ambos em minoria.
Até porque a ambas as categorias é solicitado estudar e trabalhar muito, num longo percurso muito específico que não inclui atalhos. Eles têm que aceitar os limites de seu entendimento. E nunca devem ter medo diante de algo que não entendem, mesmo que isso exija muita coragem. Depois, há um outro aspecto que pertence aos dois âmbitos e que tem a ver com os temas da encíclica.
Qual?
A consciência de que cada nossa ação, mesmo a menor, têm consequências no sistema global. Perceber isso não é apenas uma conquista moral, mas também científica. É por isso que hoje percebemos que vivemos de acordo com um modelo que não é sustentável. Há algum tempo li uma estatística segundo a qual um cidadão dos Estados Unidos tem 11 quilowatts de potência à disposição, um europeu 6 ou 7, um chinês 2, um indiano 0,2 e outros ainda menos. Existem demasiadas velocidades diferentes neste planeta.
A esse respeito, o Papa também dedica espaço aos migrantes.
E me pergunto como é possível que a Europa, com meio bilhão de habitantes, não consiga administrar uma questão que diz respeito a alguns milhares de pessoas, deixando-as até morrer nos barcos. Olhando para os números, não podemos deixar de perceber que é um problema muito pequeno para que a Europa não saiba gerenciá-lo melhor do que está fazendo.
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