“Parecer” encomendado pela Folha e usado por Temer é uma vergonha, inclusive, gramatical. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 21 de maio de 2017 às 11:35
Temer termina pronunciamento segurando a mão de seu último eleitor

Todo o discurso de Michel Temer no sábado, dia 20, teve como argumento principal a manchete da Folha de S.Paulo, segundo a qual a fita entregue pelo empresário Joesley Batista foi editada.

Pode ser, pode não ser.

Mas não é preciso muito esforço para concluir que o texto do jornal foi exagerado na defesa de Michel Temer.

O perito Ricardo Caires dos Santos fez o que pode ser considerado, no máximo, parecer – uma opinião técnica, sem compromisso com a verdade.

Mas o jornal apresenta esse trabalho como laudo.

E há diferença substancial entre laudo e parecer.

O laudo é um estudo minucioso, em geral demorado, e Caires dos Santos não teria condição de produzi-lo sem examinar, também, o aparelho em que o áudio foi captado.

Atente-se para as credenciais de Caires do Santos apresentadas pela Folha de S. Paulo: perito do Tribunal de Justiça de São Paulo.

Não existe perito do Tribunal de Justiça de São Paulo.

Não existe essa carreira no Judiciário.

O que existe é perito particular, nomeado pelo juiz, e nesse caso são muitos, inclusive Caires dos Santos.

Embaralhar uma investigação fazendo uso de pareceres técnicos é um recurso de muitos criminalistas.

O promotor Edilson Mougenot Bonfim, que atuou no 1º Tribunal do Júri em São Paulo durante muitos anos, conta em seu livro “No Tribunal do Júri” como desmascarou essa farsa, no julgamento de uma mulher acusada de matar o marido.

Um caso rumoroso à época, conhecido como Viúva Negra.

Um perito contratado por um criminalista deu parecer que justificava a presença de elementos de pólvora na mão da cliente com fotos dela enxugando lágrimas com um lenço.

A conclusão do perito é que o lenço era do cunhado, que havia manuseado uma bateria de automóvel no dia e contaminado aquele pedaço de pano com componentes que poderiam ser encontrados também na bala de um revolver.

Daí porque, no exame residuográfico, a perícia oficial (esta existe, como departamento da Polícia Civil) concluiu que ela havia feito disparo com revólver.

O parecer continua citações em francês e apresentava gráficos, era bonito na aparência.

O promotor chamou o perito para depor e começou a fazer perguntas em francês, idioma que o perito não conhecia.

— O senhor não sabe francês, mas faz um parecer, que o senhor chama de laudo, porque quer impressionar o júri e o juiz, para confundi-los e tirar a atenção do essencial: esta mulher matou o marido.

O promotor conseguiu a condenação da acusada – que, por sinal, fugiu depois, quando pode recorrer em liberdade.

Este caso, conhecido entre os criminalistas, trouxe à tona a chamada indústria dos pareceres.

Peritos famosos, quando contratados por particulares – exemplo da Folha de S. Paulo ou da defesa de um acusado de crime –, mentem à vontade, sem risco de serem responsabilizados criminalmente.

Parecer é opinião, e opinião cada um tem a sua.

Já o laudo, quando parte integrante da investigação, deve ser verdadeiro, sob pena do crime de falsa perícia.

Daí porque laudo, em geral, não é feito em dois dias, sem todos os elementos de análise.

A Folha de S. Paulo embarcou no Titanic de Michel Temer por razões que não se conhece.

O parecer encomendado para desqualificar a gravação é uma vergonha, inclusive, do ponto de vista gramatical.

Abaixo, a conclusão de Ricardo Caires dos Santos: