Parte de comitê do caso Carrefour, Silvio Almeida avisa que não existe “capitalismo humanista”

Atualizado em 27 de novembro de 2020 às 14:36
Silvio Almeida. Foto: Reprodução/Twitter

O intelectual Silvio Almeida explicou sua atuação em um comitê com o Carrefour.

Escreveu um esclarecimento nas redes sociais.

No Twitter:

“Segue um fio sobre o ‘Comitê’ externo e independente do caso Carrefour

1. Fui chamado a participar por outras pessoas que integram o Comitê (e não pela empresa) e que pediram minha ajuda para pensar formas de reparação e responsabilização que fossem efetivas e que não caíssem no esquecimento. Não é e nem nunca foi um grupo de ‘diversidade’.

2. Após muito refletir e conversar com pessoas próximas concluí que deveria lutar para que a família obtivesse a adequada indenização, mas também que fosse oferecida à comunidade negra uma resposta eficiente, que venha a se tornar um modelo

3. Decidi também que seria honesto e importante que as pessoas soubessem da minha participação, já que não se trata de ‘compliance’ ou de ‘assessoria’.

4. Sendo eu reconhecido como estudioso do tema, pensei que seria meu dever contribuir nesse momento tão confuso e tão difícil

5. Segundo a ideia a mim apresentada, o Comitê serviria para, de forma independente, propor medidas para que violências como a que tirou a vida de João Alberto não mais aconteçam

6. As propostas do Comitê seriam feitas de forma a atender as reivindicações que há muito vem sendo feitas e que nunca foram atendidas pelo Carrefour ou por outra empresa

7. O Comitê foi criado – e é nisso que estou acreditando – para fornecer uma pauta que permitirá que a sociedade – inclusive as autoridades estatais – cobre a empresa em relação à sua implementação

8. Não trabalho para o Carrefour, não fui chamado pela empresa e nem irei funcionar como ‘assessor’. O intuito do Comitê é propor formas de reparação e meios de responsabilização que possam contemplar a família de João Alberto, mas também ao conjunto da sociedade.

9. Portanto, não sou assessor ou coisa que o valha, o que aliás foi uma condição para que eu participasse. Apenas não quero mais que outra pessoa seja assassinada e tenhamos como resposta ‘palestras de sensibilização’ em dois meses do ano e indenizações irrisórias

10. Não quero mudar a empresa e acho impossível e até absurda a existência de um ‘capitalismo humanista’. Não há ingenuidade aqui. A questão é de tomar uma decisão em defesa da vida: se eu puder evitar que mais uma pessoa morra, sinto que é meu dever fazer algo

11. Se puder ajudar a pensar formas de reparação amplas e eficientes que envolvam a comunidade, eu farei. Se eu puder ajudar a estruturar financeiramente projetos de pessoas negras e indígenas, auxiliar comunidades quilombolas […]

12. […] possibilitar que jovens negros possam estudar, impedir o fechamento de centros de cultura não tenham dúvida de que eu o farei.

13. Um exemplo de questão central que quero levantar no Comitê é a relação entre precarização do trabalho, terceirização e racismo. E não acredito que algo possa ser feito sem revisar as formas de contratação dos serviços de segurança e sem uma definição da responsabilidade

14. Outro exemplo de proposição pensada pelo Comitê é a rediscussão da própria ideia de ‘segurança’. As empresas de segurança trabalham a ideia de segurança como ‘segurança da mercadoria’, e não como ‘segurança das pessoas’.

15. Um negro não se sente ‘seguro’ em uma loja justamente porque é perseguido nos corredores. Como mudar isso? Como interromper essa cultura de perseguição a negros em lojas? Essa é a questão que me propus a pensar

16. Em paralelo a isso tudo, participarei hoje, às 11h30, da reunião de uma comissão de juristas instituída pela Câmara dos Deputados para apresentar propostas para a criação de legislação que trate do racismo institucional

17. Termino agradecendo as pessoas que confiam em mim e que acreditam no trabalho que venho desenvolvendo nos últimos anos. Farei de tudo para honrar a confiança de vocês”.