PCC e CV não penetraram no Equador: como está dividido o poder no narcoestado

Atualizado em 14 de janeiro de 2024 às 11:32
Adolfo Macías, o Fito, líder da maior facção equatoriana, Los Choneros, fugiu da prisão perto de Guayaquil

Bem no meio dos cartéis de refino colombiano e peruano, os dois maiores produtores mundiais de cocaína, o Equador tornou-se, após a morte de Pablo Escobar, chefe do Cartel de Medellín, estratégico como ponte de passagem do pó para Estados Unidos e Europa.

Violência, assassinatos e a influência devastadora do crime organizado no poder político local cresceram e, junto com eles, eclodiu a já temida facção criminosa Los Choneros, que só surgiu em 2020. A curiosidade é que, mesmo interessados no pó que vem dos parceiros de cima, matéria-prima para o mercado interno, os cartéis brasileiros PCC e CV ficaram de fora do terrorismo equatoriano.

Essas gangues equatorianas dependem economicamente das organizações criminosas transnacionais da Colômbia, Peru e do México. E o Equador, como aconteceu num Brasil de PCC, Comandos Vermelhos e outras gangues, lembra um especialista, acordou tarde. As gangues equatorianas conseguem, como no Brasil ter controle de territórios e social. E comandar da prisão.

O DCM ouviu o ex-magistrado Walter Fanganiello Maierovitch, estudioso das máfias italiana e brasileira, e criador da secretária Nacional Antidrogas, além de, em reserva, um ex-secretário de Segurança Pública do Rio, que confirmm que o caos equatoriano, provocado pelos Los Choneros, não tem ajuda dos cartéis brasileiros, ainda que os grupos se conheçam e tenham negócios. Segundo essas fontes, Comando Vermelho e Primeiro Comando da Capital, maiores narcocartéis nacionais, não tem bala na agulha para sair de suas próprias disputas territoriais, que aqui ainda envolvem mlícias, para se   meter no caos equatoriano. Mas total interesse na reconfiguração de poder no norte do continente.

“O Peru voltou a ser o maior produtor de folha de coca do continente, a Colômbia, pós-Pablo Escobar, montou microcartéis, com vastos laboratórios de processamento da droga na região, e os dois países se dividiram no refino”, diz Maierovitch. “Nesse período o pequeno Equador mudou seu papel, numa reconfiguração das rotas de tráfico locais. Com isso, o país virou um entreposto do tráfico, montou grandes grandes bandos armados, e chegamos a esse ponto”.

O papel estratégico do Equador na rota do narcotráfico foi antevisto pela DEA (Drug Enforcement Administration, o órgão americano de controle de narcóticos) no final dos  anos 90, governo Reagan, quando montaram logo ali, entre os narco-refinadores Colômbia e Peru, uma base militar, em Manta – desativada no governo do presidente Rafael Correa, mas recentemente reativada para operações militares.

O outro entreposto para a passagem da droga que vem da Colômbia e Peru na América Central, hoje, é a Guatemala, mas os cartéis que fazem a distribuição da droga são os mexicanos. O roteiro está armado, e não precisa do Brasil. O grupo colombiano Clã do Golfo, as dissidências das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e facções locais como Los Lagartos e La Jauría também atuam no Equador, que virou um hub do marcotráfico.

Daniel Noboa, o ricaço presidente do Equador, ainda durante a campanha, de colete à prova de ballas

O Los Choneros, comandado por Adolfo Macías, o Fito – que fugiu da prisão perto de Guayaquil, pouco antes do início da onda de ataques – no entanto, é internacional. Tem fortes ligações com o grupo mexicano Jalisco Nova Geração (CJNG), o mais robusto narcocartel da região junto com o Cartel de Sinaloa, que nos últimos cinco anos assumiram um papel mais importante no negócio. O CJNG é liderado por Nemesio Oseguera Cervantes, El Mencho, um dos traficantes de drogas mais procurados do mundo. Além deles, que disputam o controle das rotas de cocaína no Equador grupos dos Bálcãs que a polícia chama de “máfia albanesa”.

Nada surpreende dois meses depois de uma violenta campanha eleitoral equatoriana, marcada pelo assassinato de um dos candidatos, o jornalista Fernando Villavicencio, ameaças do narcotráfico e um forte esquema de segurança para as votações. O próprio presidente Daniel Noboa não sai do palácio sem colete à prova de balas, carro blindado e um mundarel de seguranças. Noboa ainda assumiu num cenário político temperado a lança-chamas: o atual presidente do país, Guillermo Lasso, eleito em abril de 2021, enfrentou um processo de impeachment, o primeiro na história recente do Equador.

Com uma base frágil no Legislativo, ele resolveu dissolver o Congresso e convocar novas eleições. A dissolução da Assembleia Nacional e convocação de novas eleições presidenciais foi chamada, premonitoriamente, de morte cruzada. O futuro do país depende agora das decisões de um milionário de 36 anos.

Como resume Carla Álvarez, professora e pesquisadora de segurança no Instituto de Altos Estudos Nacionais (IAEN) do Equador, o Equador é hoje um narcoestado governado desde as prisões pelo crime organizado. Quem manda do lado de fora, ninguém sabe.