PEC da Blindagem é pior que o tribunal do crime do PCC

Atualizado em 17 de setembro de 2025 às 11:23
Preso usa escudo com iniciais do PCC em cadeira no Rio Grande do Norte. Foto: Josemar Gonçalves/Reuters

A aprovação da chamada PEC da Blindagem, nesta terça-feira (16), pela Câmara dos Deputados, escancara um pacto de autoproteção que rebaixa o Parlamento brasileiro a um patamar ético inferior ao dos “tribunais do crime” do Primeiro Comando da Capital (PCC).

Enquanto o PCC organiza julgamentos paralelos para manter a disciplina de seus integrantes e impor sua lei nas comunidades, a PEC aprovada em dois turnos (353 votos a favor e 134 contra no 1º; 344 a 133 no 2º) cria um sistema de blindagem judicial para deputados, senadores e presidentes de partidos. Na prática, é um salvo-conduto que permite ao Congresso barrar prisões, controlar processos criminais e expandir o foro privilegiado, independentemente da gravidade das acusações.

A proposta prevê que prisões em flagrante de parlamentares só sejam mantidas após votação secreta da Câmara ou do Senado. Além disso, o Supremo Tribunal Federal precisará pedir autorização prévia ao Legislativo para processar deputados e senadores — algo que vigorou entre 1988 e 2001 e resultou em apenas um único processo autorizado em mais de uma década.

No PCC, os “tribunais do crime” seguem um ritual sombrio: o acusado é intimado, há coleta de testemunhos e, em seguida, o veredito — muitas vezes a morte. Trata-se de um sistema brutal e ilegal. Mas, por mais bárbaro que seja, a facção criminosa não mascara sua lógica: quem manda pune para manter o controle.

Já no Congresso, a PEC disfarça em roupagem constitucional o que é, essencialmente, uma tentativa de anular a aplicação da lei a uma casta política. Diferentemente do tribunal do PCC, que atua à margem do Estado, a blindagem parlamentar busca capturar o próprio Estado, subtraindo do Judiciário a função de julgar crimes comuns praticados por políticos.

Se o tribunal do crime do PCC impõe medo nas periferias, a PEC da Blindagem instala um regime de impunidade no coração da democracia. Ao dar aos parlamentares o poder de decidir sobre a prisão e o julgamento dos próprios pares, a Câmara cria um mecanismo que nem mesmo a facção criminosa ousou: transformar a proteção dos seus em cláusula constitucional.

Nesse sentido, a PEC não é apenas comparável ao tribunal do crime. É pior. Porque, enquanto o PCC atua na ilegalidade, o Parlamento brasileiro está tentando legalizar a impunidade.