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Plano de Israel trata 1 milhão de palestinos pior que gado de corte. Por Leonardo Sakamoto

Escombros de prédio destruído após ataque israelense na Faixa de Gaza. Foto: Ibraheem Abu Mustafa/REUTERS

Por Leonardo Sakamoto

Em seu esforço de responder à matança terrorista do Hamas com crimes contra a humanidade, o governo de Israel mandou que 1,1 milhão de moradores da região norte da Faixa de Gaza se desloquem ao sul do território em 24 horas porque o seu exército vai chegar chegando.

Considerando que nem transferência de gado para o abate poderia ser tão rápida, o resultado caótico dessa onda instantânea de refugiados vai ser sofrimento e morte, caso boa parte dos moradores decida ir. Tal como o sofrimento e morte que esperam boa parte dos moradores que decidirem ficar e encarar a invasão israelense.

Um semovente desavisado dirá “Ah, mas o trajeto do centro da cidade de Gaza até Haffa, ao sul, é de uns 35 quilômetros, mais ou menos o que separa o centro de São Paulo até o condomínio Alphaville, em Santana do Parnaíba. Ou seja, os palestinos conseguem fazer isso em algumas horas”.

Para além da estupidez de achar que é possível mover 1,1 milhão de almas, incluindo idosos, crianças, pessoas com deficiência, doentes, feridos dos hospitais em um dia, há o agravante de que a população está enfraquecida devido ao aprofundamento do cerco a Gaza. Falta água, comida, medicamentos. Falta combustível e eletricidade para deslocar toda essa gente.

Como o Egito ainda não concordou com um corredor humanitário para que a população civil saia do território pelo Sul, nem Israel acenou em parar de bombardear para que isso aconteça, o trânsito de mais de 1 milhão de pessoas provocaria, segundo as Nações Unidas, “consequências humanitárias devastadoras”.

E, como era de esperar, o Hamas, de forma criminosa, está contraordenando aos moradores do norte para que fiquem em suas casas. Precisam de escudo humano. O cálculo dos cidadãos de Gaza é mais racional, contudo: chegando lá, eu fico aonde? Dormindo e cagando na rua?

Tanque de guerra israelense estacionado perto da fronteira de Gaza. Foto: Ahmed Zakot/SOPA Images/LightRocket via Getty Images

Israel tem direito a defender a sua existência e punir o grupo que matou mais de mil pessoas em seu território. Mas o que estamos assistindo não é a reação de um estado que se diz democrático tentando resgatar reféns e prender criminosos, mas de uma punição coletiva ao moradores de Gaza – que não são culpados pelo Hamas.

Punição que tem requintes de crueldade. A Human Rights Watch denunciou que Israel está bombardeando Gaza com fósforo branco, que provoca queimaduras profundas, fritando carne e ossos. As escaras abertas por ele em corpos não cicatrizam facilmente. Era usado até a Guerra do Vietnã, mas uma das Convenções de Genebra condenou seu uso como arma onde existam civis.

Ao mesmo tempo, campos de refugiados e centros de saúde têm sido atingidos pela competente artilharia “cirúrgica” de Israel, que também mata funcionários da ONU.

Não é surpreende que boa parte do mundo assista calado a um crime de guerra ser construído sob a justificativa de que após a matança hedionda de centenas em um ataque terrorista, o governo de Israel pode tudo. Até cometer terrorismo de Estado.

Provavelmente, se uma ordem esdrúxula de deslocamento fosse dada a 1 milhão de cabeças de gado haveria mais indignação planetária de governos. Mas como são apenas palestinos, toca o berrante e segue o jogo.

Publicado originalmente na coluna do Leonardo Sakamoto, no UOL

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