“Polícia entrou em casa procurando droga e arma”: jornalista denuncia abuso de autoridades em SC. Por Zambarda

Atualizado em 25 de agosto de 2019 às 17:28
Polícia Federal em Santa Catarina. Foto: Reprodução

Um Projeto de Lei sobre abuso de autoridade voltou ao noticiário e tem como relator o ex-senador Roberto Requião. Policiais, juízes e autoridades alinhadas com o ex-juiz e hoje ministro Sérgio Moro pedem que o presidente Jair Bolsonaro vete a PL após aprovação na Câmara e no Senado.

Protestando neste mês de agosto, essas autoridades consideram que o projeto é uma ameaça à Lava Jato, que está sendo desmascarada em sua parcialidade judicial.

Casos de abuso de autoridade das instituições ocorrem muitas vezes sem a devida repercussão na mídia. Segundo o Departamento de Pesquisas Judiciárias do CNJ, somados os registros de 2014 e 2015, ocorreram 10.660 casos de abuso de autoridade, seguido pelos de abuso de poder (10.457), exercício arbitrário ou abuso de poder (1.534), abuso de poder político/autoridade (1.481) e usurpação e excesso ou abuso de autoridade (339).

Uma denúncia encaminhada ao DCM pelo jornalista Ivan Claudio Siqueira de Moraes, de 33 anos, mostra a realidade de como as autoridades lidam com denúncias públicas.

Natural de Santos, SP, ele é professor universitário desde 2013 e mestrando em Lages, no interior de Santa Catarina. Ele relata “ameaças, terror e assédios físicos e psicológicos pelos órgãos de Estados do país”.

Ivan Claudio Siqueira de Moraes. Foto: Arquivo Pessoal

Lecionava na Universidade do Planalto Catarinense (Uniplac) e estudava na Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC).

Moraes afirmou em email ao Diário que denunciou possíveis casos de corrupção que envolvem o Ministério Público e PF. “Estou passando por terrorismo e sendo acuado por esses órgãos que atentam contra minha vida”, explica.

Ele registrou dois Boletins de Ocorrência e diz que passou por um procedimento chamado “amansa cidadão” feito pela Polícia Federal a mando do MP.

Denúncias em Lages

Ivan Moraes afirma que fez denúncias sobre o Ministério Público de Santa Catarina e o Ministério Público Federal referentes a erros materiais da sentença de uma juíza em seu processo trabalhista por demissão “injusta e forjada”, nas palavras do próprio.

As informações foram encaminhadas ao Tribunal Regional do Trabalho da 12º Região (TRT12). “Eles resolveram ignorar os erros e deram razão para magistrada”. Moraes afirmou ao DCM que fez uma investigação jornalística e soube que a magistrada é “casada com homem ramo do empresarial e trabalhista, algo proibido por lei” para a mesma atuar em Lages.

O professor não fez denúncias apenas em 2019. Antes, ele já esteve envolvido solicitando informações e recorrendo à Lei de Acesso a Informação (LAI), que foram recusadas.

Ele afirma que, em 2016, quando estava cursando mestrado na UDESC, constatou irregularidades na sua opinião graves envolvendo a não divulgação da lista de classificados e suplentes, envolvendo indicações políticas.

Ivan Claudio Moraes diz que sua demissão foi motivada por ele ter sido contrário ao retorno de um professor ao curso que tem “histórico racista e responde inquérito policial”.

O docente teria falado que “não dava aula pra preto ou bolsista”, entre outras declarações preconceituosas. Estudantes chegaram a fazer abaixo-assinado pela reintegração do professor, sem sucesso.

Na condução das denúncias, Ivan Moraes acusou o delegado da Polícia Federal em Lages, Wilson Paese, de conduta “parcial” no mesmo caso que envolve a juíza Michelle Araldi.

Os casos aconteceram entre janeiro e março de 2019. No mês de abril, o delegado Paese reassumiu um cargo de vereador em outra cidade de Santa Catarina, Videira. Ele é político pelo PSD e Moraes questionou o conflito de interesses no cargo.

O delegado da Polícia Federal que também é vereador. Foto: Reprodução

Polícia procurando “droga e arma”

Ivan Claudio Siqueira de Moraes narra um episódio mais grave envolvendo as denúncias que fez a um professor, delegado e juíza em Lages:

“Durante esse tempo em que fiz denúncias, coisas ‘estranhas’ começaram a acontecer. Cada vez que ia no MPSC, um PM me seguia dizendo ‘para me cuidar’, ‘porque iam me pegar mais cedo ou mais tarde’. Por que sou perigoso? Não ando armado, não tenho antecedentes criminais, sou professor, estudante…”.

“A PF tirou inúmeras fotos da minha casa durante uma ‘investigação’ deles, infrutífera e com abuso. Passavam buzinando, fazendo várias idas e vindas para intimidar. A Polícia Militar entrou na minha casa com meu consentimento, pois colaboro, e jogou minhas roupas e alimentos no chão ‘procurando droga e arma de fogo’. Não acharam nada. No âmbito da UDESC, sofri um atentado de atropelamento do professor indiciado. Já em relação ao professor racista de onde fui demitido, seus colegas ‘tomaram as dores por ele’ sempre ao passar próximo a um ‘café dos políticos’ daqui de Lages, o Julius´s Café, ouvia que ia me pegar, ou sumir comigo, me ameaçando e ofendendo minha cultura por ser um paulista em Santa Catarina”.

Ivan Moraes disse que ele e seus alunos demoraram dois anos para fazer as denúncias envolvendo comentários do professor. O que é ainda mais incompreensível no seu caso é o seu desligamento do seu trabalho, a atuação da juíza e de um delegado da PF que, na verdade, é vereador pelo PSD em outra cidade.

Outro lado

O DCM entrou em contato com a Superintendência da Polícia Federal em Santa Catarina em dois endereços de email e três telefones.

O gabinete da PF no estado informou o Diário que sua equipe de comunicação está em atividades de cidades no interior e que não poderia responder imediatamente a reportagem.

O espaço está aberto para a manifestação da PF e dos envolvidos no caso.