População densa, informalidade e saúde precária: as cidades mais expostas à covid-19. Por Erick Gimenes

Atualizado em 15 de abril de 2020 às 22:09
Menino brinca em área de São João do Meriti, o município mais frágil ao coronavírus, conforme estudo – Foto: Tânia Rego/Agência Brasil

Publicado originalmente no Brasil de Fato

Por Erick Gimenes

Populações envelhecidas e amontoadas, alto índice de informalidade e estrutura sanitária em ruínas formam a combinação trágica para que municípios pequenos e médios estejam no topo da cadeia dos mais frágeis ao novo coronavírus no Brasil.

Um estudo conduzido pelo geógrafo e cientista de dados Ronnie Aldrin Silva, divulgado pela Fundação Perseu Abramo, aponta que, entre os 30 municípios mais vulneráveis à covid-19, apenas quatro tem mais que 500 mil habitantes. A maioria tem alto índice de pobreza e favelização de moradores. Entre as capitais, só Fortaleza aparece na lista dos primeiros.

Ronnie é autor de publicações sobre as temáticas de exclusão social, mercado de trabalho e gestão pública e construiu a análise com base em microdados públicos fornecidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Segundo o autor, a análise não leva em conta os números de casos atuais divulgados pelo Ministério da Saúde em nem pretende fazer projeções de doentes. A ideia é apontar quão exposto está cada município para que, a partir das mazelas estruturais diagnosticadas, as autoridades saibam por onde começar a lidar com a doença.

“O objetivo principal é auxiliar o gestor público para ver em que situação de fragilidade, de vulnerabilidade, está o município dele para um eventual alastramento do coronavírus. E para que ele tome atitudes de prevenção, uma vez que é de conhecimento universal que, quanto antes você atuar, menores vão ser os efeitos na sua população”, explica Aldrin.

Combinação desastrosa

Para chegar ao resultado, o pesquisador analisou 18 indicadores e os agregou em cinco dimensões principais: densidade demográfica, faixa etária, infraestrutura sanitária e elétrica, mercado de trabalho e estrutura de saúde.

Todos são índices relevantes, ressalta o autor, mas uma combinação, em especial, é desastrosa para uma pandemia viral: populações densas e mercado de trabalho inconsistente.

Infografia: Fernando Bertolo

É o caso do líder do ranking, São João do Meriti, município da Baixada Fluminense, na região metropolitana do Rio de Janeiro, que já foi vila de fazendas e capelas religiosas nos séculos 17 e 18 e hoje é conhecido como “formigueiro das Américas”.

Por lá, vivem aglutinadas 472.406 pessoas, segundo o Censo. É a maior densidade populacional do país. Como se não bastasse, os meritienses trabalham com muita informalidade e pouca chance de parar de trabalhar para fazer quarentena.

“Ele [o município] tem uma grande densidade demográfica e condições de mercado de trabalho muito precárias. Então, junta esses dois fatores: as pessoas vão precisar ir para a rua, em São João de Meriti, para trabalhar. Eles vão se relacionar, inevitavelmente, com muita gente”, alerta o pesquisador.

Estrutura desigual

Ronnie destaca que, por mais que liderem o número de casos de covid em números absolutos, capitais fogem da lista de mais fragilidade porque conseguem manter estrutura melhor.

“Geralmente as capitais têm seus problemas, como violência, mas oferecem melhor infraestrutura para a população, em média. Você tem melhores empregos, tem melhor infraestrutura sanitária e de saúde. Por mais que você tenha muitos casos, você tem uma estrutura sanitária melhor para lavar a mão, você tem um percentual maior de pessoas que podem fazer quarentena”, afirma.

Ronnie ressalta que os problemas apontados no estudo são estruturais, enraizados, impossíveis de serem solucionados em pouco tempo. Por isso, ao passo em que a pandemia se alastra de imediato, ele sugere que as autoridades locais e o governo federal busquem soluções paliativas, principalmente focadas em programas de transferência de renda.

“Esses índices mostram problemas estruturais da cidade. Coisa que não se resolvem em dez, às vezes até em 20 anos com uma política focada nisso. Você tem que pensar em programas de transferência de renda de uma forma mais intensa nesses municípios. Seja a estrutura do Estado organizando, o município organizando. De repente, uma bolsa maior para esse município. É uma ferramenta que o governo federal, inclusive, poderia utilizar”, deixa no ar.

Infografia: Fernando Bertolo