Por mais evidências que haja, é preciso garantir a Paludo o que ele sempre negou aos outros: presunção de inocência. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 30 de novembro de 2019 às 11:25
Januário Paludo

A Lava Jato levantou cedo neste sábado, mas não foi para prender pessoas sem condenação  nem para levar investigados sob coerção para prestar depoimento — uma espécie de pena antecipada —, como se tornou comum desde 2014, quando a operação teve início.

Os procuradores se mobilizaram para defender uma de suas figuras mais emblemáticas, o Januário Paludo, citado num caso de corrupção. Em mensagem trocada com a namorada, Dario Messer, o doleiro dos doleiros, disse que Paludo era um dos “meninos” que recebiam mesada dele.

A nota divulgada pela Lava Jato diz que o veterano procurador, o mais experiente deles, remanescente do caso Banestado, não investigava Messer e, portanto, não faria sentido que fosse sustentado por ele.

A nota segue o padrão de defesa da Lava Jato: sempre que um membro é citado como envolvido em história nebulosa, o grupo diz que fulano não atuava naquele caso específico. Foi assim com Deltan Dallagnol, em relação a um citado que o contratou para palestras — Jorge Luz, da Neoway.

Foi assim também em relação a Diogo Castor de Mattos, que atuava de um lado de balcão enquanto o irmão, o advogado Rodrigo, atuava de outro. Rodrigo recebeu pelo menos R$ 2 milhões no acordo de delação fechado pelo MPF com o casal de marqueteiros João Santana e Mônica Moura.

No caso de Paludo, em nenhum momento, Dario Messer citou um caso específico para justificar a propina. Ele pagava para ter proteção, e é natural que, em casos assim, o mais experiente do grupo de procuradores seja o veículo.

Isso não quer dizer que Paludo deva ser considerado culpado. Pelo contrário. Desde cedo, juristas têm se manifestado no sentido de que se garanta ao procurador a presunção de inocência.

O criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que defende vários réus da Lava jato, divulgou nota.

“Precisamos manter a coerência e defender para este Procurador os direitos pelos quais sempre lutamos”, escreveu.

Mas não deixou de observar que, se Paludo fosse político ou um empresário, já teria havido pedido de prisão e ele seria apresentado em entrevistas como culpado.

“A incoerência destes procuradores é um avanço, precisamos defender para estes procuradores da força-tarefa a presunção de inocência, o direito à ampla defesa, o devido processo legal e a certeza de que só serão presos após o trânsito em julgado”, disse.

Por sua vez, o advogado Agusto de Arruda Botelho, um dos fundadores do Instituto de Defesa do Direito de Defesa, afirmou:

“Apesar da denúncia ser muito grave, é importante que o Procurador Januário Paludo tenha ao seu lado algo que ele mesmo, por muitas vezes, desprezou: a presunção de inocência.”

Ex-conselheiro federal da OAB, Rodrigo Lago destacou que é preciso dar a Paludo que ele sempre negou a investigados.

“Estão crucificando o procurador Januário Paludo, um dos próceres da Lava Jato, porque captaram telefonema de criminoso afirmando que pagava propina a ele. Mesmo sendo ele, defendo a presunção de inocência, até que provem o contrário. É pena que ele não pensa assim sobre outros.”

O que vale para Paludo vale para todos, num país civilizado: é preciso investigar a fundo a denúncia, sem condená-lo antecipadamente. Há vários caminhos para avança na investigação.

Além de Messer, dois outros doleiros mencionaram o pagamento de uma mesada para ter proteção no Ministério Público Federal e na Polícia Federal em Curitiba: Cláudio Souza e Vinícius Claret, o Juca Bala.

Eram 50 mil dólares por mês (mais de 200 mil reais hoje). Segundo eles, o dinheiro começou a ser entregue ao advogado Antônio Figueiredo Basto em 2008, por conta dos desdobramentos do caso Banestado.

Na defesa de Paludo, a Lava Jato diz que Figueiredo Basto pode ter cometido o crime de exploração de prestígio: usava o nome dos procuradores, mas embolsava o dinheiro. Não ia nada para eles.

É uma linha de defesa, mas que pode ser desmontada quando se observa que Messer nunca foi incomodado pela turma de Curitiba, embora seu nome tenha aparecido no caso Banestado. Figueiredo Basto foi advogado de Messer.

A linha de defesa da Lava Jato também se enfraquece diante de um fato incontestável: nenhum outro advogado conseguiu tantos acordos de delação quanto Antônio Figueiredo Basto na 13a. Vara Criminal Federal de Curitiba, onde a Lava Jato nasceu.

Prestígio, o advogado tinha, portado. É preciso ver como o explorava, se só na técnica ou no relacionamento com gente como Paludo.

A sociedade tem o direito de conhecer a verdade, sobretudo quando está no foco uma figura passava a imagem de cruzado da moralidade pública.