
Uma sugestão de leitura.
“O Palácio de Inverno”, de John Boyne (Companhia das Letras). É um romance que mistura realidade e ficção. O resultado é que você se entretém e ao mesmo tempo aprende.
Especificamente, se inteira sobre a Rússia dos últimos Romanovs. Boyne é hábil em colocar curiosidades históricas. Você tem detalhes da morte de Rasputin, o monge devasso que a czarina Alexandra confiava poder salvar o seu filho Alexei nas crises de hemofilia que ameaçavam matá-lo ainda criança.
Rasputin, fortíssimo, sobreviveu a uma dose de veneno capaz de matar um touro. Levou tiros. Foi atirado enfim no rio Neva, congelado. Posteriormente se descobriu pelas unhas que ele tentara escapar do gelo que o prendia às profundezas. Partidários do czar mataram-no porque achavam que ele estava levando o regime para o abismo: os adversários diziam que ele influenciava as decisões de Nicolau II e, se não bastasse, fornicava com a czarina e as grã-duquesas.
Boyne descreve a dor aguda que um hemofílico sente numa crise. Você fica sabendo também que, por ordem da czarina, o trem que levava a família real para o Palácio de Inverno ia no máximo a 24 km por hora, para evitar que solavancos pudessem machucar o pequeno Alexei.
No meio de tudo, Boyne colocou um caso de amor entre dois emigrados russos, ligados à corte.
O livro me fez pensar de novo num assunto que me fascinou na juventude, a Revolução Russa.
Não podia dar certo um regime que para se consolidar imaginava ter que matar toda a família do czar. É um dos episódios mais cruéis, mais selvagens da história da humanidade. A família, que estava detida, foi massacrada a tiros num porão pelos guardas bolcheviques. Nicolau, Alexandra, mais os cinco filhos., Alexei e suas quatro irmãs mais velhas, belíssimas. Nunca se soube direito de quem partiu a ordem.
A lógica era a mesma que serviu para que o rei Luís fosse executado na França. Evitar que a reação aos revolucionários se aglutinasse em torno de um símbolo forte como um rei ou um czar. Mas na França houve pelo menos um simulacro de julgamento, e as crianças foram poupadas.
Os 70 anos de Revolução Russa foram um horror. Como endireitar uma lógica tão torta que aceitava que uma família fosse morta num porão?
O mundo ficou melhor sem o comunismo soviético. Não surpreende que a União Soviética tenha desabado tão abruptamente no final dos anos 80, putrefata. O que causa tristeza e perplexidade é que tenha durado tanto tempo uma experiência sanguinária e inclemente que, na história moderna, só encontra paralelo na Alemanha nazista.