
Essa é uma das perguntas mais frequentes do século das novas e das velhas dúvidas sobre o jornalismo: por que um repórter ainda é importante?
Para que uma resposta, como a de Bolsonaro a Igor Coelho no Flow Podcast, não fique pela metade, como acabou ficando.
Igor, conhecido como Igor3K, perguntou, na última sexta-feira (14), durante live com Bolsonaro, o que levou o sujeito a viajar para os Estados Unidos antes da posse de Lula, em dezembro de 2022. Essa foi a resposta, na íntegra:
“Eu tinha um pressentimento que podia ter algum problema aqui no Brasil. Vou sair do Brasil, não confio nesse cara que tá chegando, não vou passar faixa pra ele jamais e vou curtir a minha ressaca lá fora do Brasil. Se eu ficasse aqui, eu estava ferrado. Agora, repetindo aqui, você pode dar golpe em cima de prédio vazio? O que é um golpe? Você chega no chefe de Estado mata, prende, deporta”.
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E o que fez o entrevistador? Pulou, no final da resposta de Bolsonaro, para o Plano do Punhal Verde Amarelo para matar Lula, Alexandre de Moraes e Geraldo Alckmin.
Os principais resumos sobre a entrevista destacaram que Bolsonaro fugiu porque sentiu que iria se ferrar. Por que iria? Igor não perguntou.
É a pergunta mais básica do jornalismo, ensinada pelos grandes entrevistadores e válida para qualquer circunstância: por quê? É um questionamento primário, que vem da infância.
Só isso. Bolsonaro deveria ser cobrado para que completasse a informação. É elementar. Fugir pra quê? Ferrado por quê? Por que falou da fuga e logo depois falou de golpe? Porque estava fazendo uma conexão entre uma coisa e outra.
Mas a pergunta não foi feita. Igor, apresentado como empresário, influencer e youtuber, é um dos fenômenos da internet. É inquestionável. Criou um canal com milhões de acessos.
Mas não é repórter. Um repórter é treinado para acionar perguntas. Faltou a pergunta depois da alegação fajuta para a fuga.
Todo mundo sabe, de Mauro Cid a Braga Netto, que Bolsonaro fugiu porque o plano do 8 de janeiro era furado. Todos eles, e não só Bolsonaro, desapareceram de cena. Por isso ele poderia se ferrar.
Mas faltou a pergunta que um dia, antes da prisão de Bolsonaro, ainda poderá ser feita: por que você acha que estaria ferrado? Que história é essa? Que pressentimento foi aquele?
Sem jornalismo, as perguntas ficam dependuradas, às vezes por décadas e até por séculos ou para sempre. E aí os ferrados são os que dependem de entrevistadores distraídos pelo roteiro de perguntas escritas por alguém num pedaço de papel.
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