Por que Doria aumentou o logo das empresas de lixo em sua fantasia de gari. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 22 de fevereiro de 2017 às 19:06
Doria gari: mensagem dos patrocinadores
Doria gari: mensagem dos patrocinadores

 

O uniforme de gari que o prefeito João Doria veste quando varre ruas já varridas de São Paulo não é diferente apenas no corte sob medida, feito por um alfaiate.

O militante cultural Devanir Amâncio, presidente da ONG Educa São Paulo, notou que o uniforme do prefeito é diferente dos garis de verdade também no aspecto publicitário.

Do lado esquerdo do uniforme, na altura da lapela, Doria fantasiado de gari ostenta o nome das duas empresas que mantêm contrato milionário para a limpeza urbana em São Paulo.

“O prefeito João Doria ainda não foi perguntado sobre a razão dos nomes das empreiteiras de lixo que carrega — com estilo impecável — do lado esquerdo do peito no uniforme de limpeza que veste serem de quase 10 centímetros, o dobro da roupa dos garis. Isso tem enorme importância ou valor no mundo publicitário. Não concordo que o prefeito vire garoto-propaganda”, disse Devanir Amâncio.

Devanir conhece bem o mundo dos garis. Graças a ele, existe uma biblioteca no espaço reservado para os funcionários da limpeza urbana ao lado de uma das passarelas na Praça da Bandeira, centro de São Paulo.

Há alguns anos, Devanir lutou junto à prefeitura para que o espaço fosse recuperado. Ali existe um refeitório, um vestiário e a biblioteca, abastecida com livros e publicações que Devanir foi buscar junto a diferentes doadores, como clubes e editoras.

“Observo que a grã-finagem paulistana se entusiasma cada vez mais com a vestimenta de gari do nosso prefeito João Doria. Os garis, sempre invisíveis, agora já cobram uma espécie de direito de imagem pelo árduo trabalho nas ruas  sujas e barulhentas da cidade. Exigem maior participação no lucro dos mais de 8 bilhões de reais que as concessionárias Inova e Soma estão recebendo da Prefeitura”, afirma.

Todos os políticos que sentaram na cadeira de prefeito nos últimos 20 anos conhecem Devanir e a ONG Educa São Paulo. Morador do Capão Redondo, periferia da cidade, ex-seminarista, Devanir está sempre reivindicando algo em favor da cidade, nunca em benefício próprio.

Há alguns anos, quando José Serra era prefeito, ele conseguiu levá-lo para um parque da cidade e fazê-lo plantar algumas mudas de árvores, para servir de exemplo a outros paulistanos.

Na gestão de Gilberto Kassab, mandou fazer um boneco de pano e o colocou nas ruas esburacadas. O boneco se chamava Beto (de Gilberto) Tatu, por conta dos buracos. Saiu nas primeiras páginas, e Devanir deu entrevista a rádios.

Discípulo do professor Aziz Ab’Saber, integrante do grupo de estudos sobre a cidade liderado pela professora Maria Stela Graciani, da PUC-SP, Devanir criticou a política de assistência social da gestão de Fernando Haddad, somando-se a vozes como a do Padre Júlio Lancelotti.

Agora, com Doria, ele começa a mostrar as falhas e contradições.

“Ninguém conhece São Paulo como o Devanir”, disse no ar o radialista José Paulo de Andrade, da Bandeirantes. “Os políticos têm que ouvir mais o Devanir”.

Doria é o queridinho da mídia e a lua de mel com os grandes veículos, como a Bandeirantes, parece estar longe de acabar.

Mas, para quem conhece a cidade nas suas esquinas e quebradas, como Devanir, Doria já não tem o mesmo apelo de alguns meses atrás.

Já perceberam que a cidade não está mais limpa nem mais bonita, mas empreiteiras saem bem na foto dos jornais, e em logo gigante, do lado esquerdo do peito do prefeito, onde bate o coração.