Por que Eliane Cantanhede foi demitida

Atualizado em 7 de novembro de 2014 às 19:51
A internet roubou sua coluna
A internet roubou sua coluna

Não fui leitor de Eliane Cantanhede em seus anos de colunista na Folha.

Apenas, ouvi falar que ela era uma das vozes mas estridentes do antipetismo.

Não tenho como julgá-la tecnicamente, portanto.

Mas notei a repercussão em torno de sua demissão, e achei que deveria dar minha visão do que está por trás dela, do ponto de vista corporativo.

A demissão de Eliane Cantanhede enquadra-se, essencialmente, na agonia da mídia impressa.

Com a Era Digital, os jornais e as revistas vão perdendo leitores e anunciantes.

As despesas não mudam, mas as receitas declinam rapidamente, num movimento sem volta.

Para prolongar a sobrevida, jornais e revistas vão cortar desesperadamente custos.

Jornalistas mais caros, como Cantanhede, serão demitidos. Você pode ter colunistas pagos apenas por coluna, o que sai muito mais em conta.

O número de páginas editoriais vai-se reduzir, mais uma razão para mandar gente embora.

Para fazer menos páginas, você precisa de menos jornalistas.

Em algum momento, como está ocorrendo nos Estados Unidos já, jornais diários passarão a ter duas ou três edições por semana.

A qualidade do papel também vai piorar. Você vai comprar o papel mais barato possível. Alguns leitores vão se queixar, mas é melhor suportar reclamações do que quebrar em pouco tempo.

Jovens jornalistas, nervosos, se perguntam se estão na profissão certa, diante de um quadro tão desolador.

Estão.

Aos poucos, os empreendimento editoriais relevantes vão se deslocando das mídias tradicionais para a internet.

Jovens talentos poderão fazer grandes carreiras na mídia digital, e num ambiente de muito maior autonomia intelectual do que o oferecido pelas empresas tradicionais.

Você nunca mais ouvirá falar, como foi tão comum no passado, no lançamento de um jornal novo, ou de uma revista nova.

As novidades estarão na mídia digital. Recentemente, o dono do e-Bay anunciou que estava investindo 350 milhões de dólares na construção de um site investigativo.

Ele contratou um dos melhores jornalistas digitais do mundo, Glenn Greenwald.

Neste exato momento, entre os jornalistas, já se observa um fenômeno: os melhores cérebros vão se transferindo para a internet, onde existe um mundo por conquistar e leitores num número que não para de crescer.

Mídias dominantes sempre atraem os melhores jornalistas, e com a internet está acontecendo exatamente isso.

A migração da publicidade rumo à internet dará solidez aos sites mais competentes como negócio e mais instigantes no conteúdo.

Eliane Cantanhede não foi despedida por ser uma má colunista, embora para os petistas ela fosse abominável.

Ela tombou por ser uma jornalista de papel num mundo digital.

Caso consiga retomar a carreira, será na internet, e não em qualquer outro jornal. Nenhum terá recursos para contratá-la, a não ser a preços vis.

Todos os jornalistas caros de jornais e revistas estão com os dias contados, e sabem disso, porque são pessoas bem informadas.

Não é hoje a demissão, é amanhã, ou depois de amanhã.

E todos os donos de jornais e revistas sabem que seus produtos estão com os dias numerados.

Não se trata de evitar a morte, mais, porque é impossível.

Trata-se apenas de prolongar a sobrevida ou, para usar a palavra mais precisa, a agonia.