Por que Obama é apenas o menos pior: um artigo do lendário Daniel Ellsberg

Atualizado em 4 de novembro de 2012 às 12:26

Ele é fraco, descriminalizou a tortura, usa drones… Mas Mitt Romney seria simplesmente uma enorme catástrofe

Daniel Ellsberg, 81 anos, é uma lenda viva. Ele era analista militar de uma empresa que prestava serviços ao governo a emericano quando em 1971 decidiu vazar para o New York Times e outros jornais o que entraria para a história como os “Papéis do Pentagono”. Os documentos deixavam claro que os Estados Unidos não tinham como ganhar a Guerra do Vietnã. Publicados eles, o governo americano, sob forte pressão da opinião pública, pôs fim à guerra. O artigo abaixo foi publicado no site americano Common Dreams.

UM COLEGA ATIVISTA recentemente me disse: “Ouvi dizer que você está apoiando Obama.” Eu fiquei supreso. “Apoiar Obama? Eu?” Respondi que não perco a chance de identificar Obama como um fantoche de Wall Street, um homem que descriminalizou a tortura, um assassino que usa drones, alguém que está lançado uma guerra inconstitucional, apoia o sequestro e a detenção sem julgamento e processou mais gente do que todos os presidentes anteriores juntos. “Você chamaria isso de apoio?”

Mas uma administração Romney / Ryan não seria melhor em qualquer aspecto. Seria muito pior, catastroficamente pior em uma série de questões importantes: o Irã, a economia, os direitos reprodutivos das mulheres, a cobertura de saúde pública, a rede de segurança, as mudanças climáticas, o ambiente. Eu disse a ele: “Eu não apoio Obama. Eu me oponho ao Partido Republicano atual. Esta não é uma disputa entre Barack Obama e um candidato progressista.” A organização republicana é extremamente perigosa, não só para os EUA, mas para o mundo. Vale a pena gastar algum esforço para impedir a sua ascensão ao poder, sem semear ilusões.

A única maneira dos progressistas e democratas bloquearem Romney é convencer pessoas suficientes em estados decisivos a votar em Obama. E isso tem de incluir liberais desiludidos que estão neste momento inclinados a não votar ou a votar em um candidato de um terceiro partido (porque, como eu, eles não estão apenas decepcionados, mas desgostosos e furiosos com muito do que Obama tem feito nos últimos quatro anos e provavelmente vai continuar fazendo).

Isso não é fácil. O mantra de eleitores do terceiro partido, segundo o qual “não há diferença significativa entre os principais partidos”, equivale a dizer: “Os republicanos não são piores, em geral.” E isso é um absurdo. É loucamente divorciado da realidade do presente.

É verdade que as diferenças entre os principais partidos não são tão grandes como seus candidatos afirmam, muito menos quanto nós gostaríamos. É mesmo justo usar a metáfora de Gore Vidal de que eles formam duas alas (“duas alas de direita”, como alguns já disseram) do Partido da propriedade, da plutocracia ou da guerra. Ainda assim, a realidade política é que uma é sem dúvida ainda pior que a outra.

Votar em Romney é algo que não serve a ninguém, a não ser aos republicanos, e ao 1%. Não é apenas compreensível, é inteiramente legítimo estar furioso com Barack Obama. Como eu estou. Ele tem agido mal de maneira escandalosa, não apenas timidamente. Se o impeachment pudesse ser decretado pela imaginação, ele teria o dele (como George W. Bush e muitos de seus antecessores). É inteiramente humano querer puni-lo. Mas a raiva não é geralmente propícia ao pensamento claro. E muitas vezes seu efeito pode resultar em votos para Romney.

Punir Obama significa punir a maioria dos pobres e marginais na sociedade, e também os trabalhadores. Não só nos EUA, mas em todo o mundo (eu acredito que os republicanos ainda poderiam converter esta recessão em uma Grande Depressão). Ele poderia muito bem travar uma guerra com o Irã (à qual Obama resistiu, indo contra a pressão de seu próprio partido). A reeleição de Barack Obama, em si, não vai trazer grandes mudanças. Mas eu diria a um progressista que, se sua consciência lhe diz para votar em alguém que não seja Obama, ele precisa de uma segunda opinião. Sua consciência está lhe dando maus conselhos.

Muitas vezes eu cito uma frase de Thoreau que teve grande impacto sobre mim: “Dê seu voto inteiro: não um pedaço de papel apenas, mas toda a sua influência.” Ele estava se referindo, nesse ensaio, à desobediência civil, ou, como ele mesmo definiu, “resistência à autoridade civil”. Isso significa usar todos os meios — redes sociais, emails, o que for — para convencer os cidadãos em dúvida a votar contra uma vitória de Romney, ou seja, na única alternativa real, Barack Obama.