Por que os jornais caíram na conversa do ‘candidato’ Felipe Neto. Por Moisés Mendes

Atualizado em 4 de abril de 2025 às 22:12
Felipe Neto em seu vídeo de “campanha ” para candidatura à presidência do Brasil. Foto: Divulgação

Os jornalões noticiaram na quinta-feira a ‘candidatura’ de Felipe Neto à presidência da República, com tom de coisa séria, e só passaram a desconfiar do vídeo do influencer depois que outros veículos (de fora da grande imprensa) alertaram que aquilo era uma jogada de marketing.

Por que os jornalões não se deram conta das referências óbvias do anúncio de Felipe Neto ao ‘1984’, de George Orwell, com muitos clichês daí decorrentes, como o de que pretendia ser “um pai que precisa vigiar o seu filho” ou um “irmão mais velho” dos brasileiros?

Por que não desconfiaram de que ele se anuncia como uma espécie de salvador da pátria, que criará uma rede dedicada a revelar a verdade e que funcionará como uma espécie de ministério? Tudo está em ‘1984’.

Por que não desconfiaram que o moço se apresentava como um ditador e que isso não fazia o menor sentido, sabendo-se das posições políticas dele?

Os jornalões deram a notícia como algo sério porque as redações não têm mais o editor sênior, ou algo parecido, que era o encarregado de erguer o braço e gritar: segura isso aí.

A notícia foi tão levada a sério que um dos grandes comentaristas da direita, Marco Antonio Villa, disse à noite na TV, no Jornal da Cultura, que Felipe Neto anunciaria que é candidato a presidente.

O historiador Marco Antonio Villa. Foto: Divulgação

Eu vi. Sem nenhuma ressalva, Villa acreditou na história. O cientista político que disse antes da Folha que a ditadura tinha sido uma ditabranda informou na TV que Felipe Neto vinha aí para enfrentar Lula, que o mesmo Villa disse antes estar fora do jogo para 2026.

Villa, o pensador liberal que se conecta com a extrema direita, também acreditou na conversa do youtuber de que viria com mais uma proposta disruptiva e antissistema de “guardião da verdade”.

Quando Villa falou (seguindo jornalistas, influencers do fascismo e outros), já se sabia que aquilo era Orwell e que o vídeo fazia parte de uma peça publicitária para anúncio do lançamento da obra do escritor em versão de audiobook.

Hoje, o influenciador disse, em outro vídeo, que fez cara e fala de autoritário para chamar a atenção e debochou: “Se você acreditou ou, pior, se você gostou do que eu falei, talvez você precise ler um pouco mais. A literatura é uma arma que uma sociedade tem para enfrentar qualquer tipo de autoritarismo”.

Já se sabia que Felipe Neto iria rir de todos eles, com aquela cara de Zelenski com que apareceu no vídeo. Na Ucrânia, o humorista que brincou com a possibilidade de um dia ser presidente acabou virando presidente.

Felipe Neto se esforçou para ficar parecido com o ucraniano, mas no Brasil o equivalente a Zelenski, pelo mesmo nível de idiotia, não seria ele, mas Danilo Gentili.

O vídeo está logo abaixo:

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Moisés Mendes
Moisés Mendes é jornalista em Porto Alegre, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim) - https://www.blogdomoisesmendes.com.br/