Por que Trump colocou a 25 de Março no centro da guerra comercial com o Brasil

Atualizado em 16 de julho de 2025 às 18:51
Consumidores na Rua 25 de Março, Centro de SP, em imagem em dezembro de 2023 — Foto: Renato S. Cerqueira/Futura Press/Estadão Conteúdo

A Rua 25 de Março, tradicional centro de comércio popular de São Paulo, virou mais um alvo simbólico do governo dos Estados Unidos na escalada de tensões com o Brasil.

O tarifaço anunciado por Donald Trump veio acompanhado de um relatório do Escritório do Representante de Comércio dos EUA (USTR), que acusa a região de ser um dos maiores polos de venda de produtos falsificados do mundo. A suposta preocupação com a propriedade intelectual, porém, soa mais como pretexto para justificar retaliações políticas, especialmente após a condenação de Jair Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado.

O documento dos EUA acusa o Brasil de omissão no combate à pirataria, citando a 25 de Março, o Brás e Santa Ifigênia, mas ignora o papel social desses centros comerciais e os esforços locais de fiscalização.

A narrativa de Washington mistura questões comerciais com críticas ao comércio digital brasileiro e insinua represálias políticas contra empresas americanas que não censuram discursos, o que revela uma tentativa velada de interferência. Até o etanol americano entrou na lista de queixas, expondo o verdadeiro interesse: pressionar o Brasil em favor de interesses econômicos e estratégicos dos EUA.

As acusações contra a 25 de Março e o comércio popular brasileiro escancaram uma ofensiva que ultrapassa a defesa da propriedade intelectual. Trata-se de um discurso que criminaliza setores populares e busca criar um clima favorável para barreiras comerciais. O governo americano instrumentaliza o debate sobre pirataria para atingir o Brasil em diversas frentes, escondendo sob o verniz da legalidade os reais objetivos políticos e econômicos de sua pressão internacional.

O presidente dos EUA, Donald Trump, com as leis que regem o Comércio Exterior dos EUA na mão. Reprodução

O texto do governo americano vai além da pirataria e também acusa o Brasil de ineficácia no combate ao desmatamento ilegal, sugerindo que essa suposta omissão prejudica a competitividade de produtores agrícolas e madeireiros dos EUA. No entanto, nenhuma das alegações é sustentada por provas concretas, conforme já apontaram órgãos oficiais brasileiros. A retórica dos Estados Unidos, mais uma vez, parece usar argumentos ambientais como fachada para interesses comerciais e geopolíticos.

A Associação Representativa do Comércio da Região da 25 de Março (Univinco25) reagiu, destacando que mais de 3 mil estabelecimentos legalizados operam na região, comercializando produtos importados, sobretudo da China. A entidade enfatiza que, embora existam casos pontuais de irregularidades, há permanente fiscalização do poder público e a grande maioria dos lojistas cumpre as normas legais. Trata-se, portanto, de um comércio diversificado e formal que não pode ser reduzido à caricatura de um polo de pirataria, como quer fazer crer o governo norte-americano.

Não é a primeira vez que os EUA tentam criminalizar a 25 de Março: em janeiro, o USTR já havia incluído a região em seu relatório anual. A novidade agora é o uso intensificado desse discurso no contexto de crescente tensão diplomática entre Brasil e Estados Unidos. A ofensiva de Washington escancara a estratégia de usar temas como propriedade intelectual, meio ambiente e comércio digital para pressionar o Brasil em múltiplas frentes, reforçando um viés imperialista que insiste em tratar países emergentes como territórios a serem vigiados e tutelados.