Por Naian Lucas Lopes
Everton Sodario (PSL), prefeito de Mirandópolis, entrou no consórcio de municípios para a compra de vacinas contra a Covid-19. O chefe do executivo da cidade que fica a quase 600 km da capital paulista é fã de carteirinha do presidente Jair Bolsonaro, mas está indo na contramão do discurso do seu ídolo.
Sodario ganhou fama no interior de São Paulo por ser defensor dos comportamentos inadequados e desumanos do “capitão cloroquina” e ser crítico ferrenho do governador João Doria. Ele é favorável ao “kit covid” e é contrário ao lockdown e medidas de isolamento para diminuir o caso de pessoas contaminadas pela doença que vem matando milhares de brasileiros todos os dias.
No ano passado, o prefeito chegou a dizer que preferia “continuar com a cloroquina do que tomar vacina chinesa do DitaDoria”. Na ocasião, o Instituto Butantan fazia teste da CoronaVac, primeiro imunizante contra a Covid-19 aprovada no Brasil e que tem sido aplicada em milhões de brasileiros desde janeiro.
Enquanto a vacina não ficava pronta, Everton distribuía um “kit covid”, que incluía hidroxicloroquina, azitromicina, ivermectina, vitaminas C e D, além de zinco. É importante ressaltar que todos são comprovadamente ineficazes para combater o coronavírus, entretanto, bolsonaristas ignoram e colocam a vida de milhões de pessoas em risco. O “kit” foi adquirido pela prefeitura, ou seja, com dinheiro público dos moradores de Mirandópolis.
A situação na cidade estava tão fora do controle, que o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL), usando seu oportunismo para angariar “aplausos” dos seus seguidores, apelidados pelos opositores de “gado”, publicou nas redes sociais a medida de Sodario e o parabenizou.
Além de colocar os moradores de Mirandópolis em risco, o chefe do executivo municipal ainda tentou enfrentar João Doria. No ano passado, tentou por três oportunidades derrubar decretos do Governo de SP, mas perdeu na Justiça. A Promotoria de Justiça de Mirandópolis, que faz parte do Ministério Público estadual, chegou a emitir recomendação ao prefeito.
No documento, foi solicitado que ele parasse de postar publicações nas redes sociais que fossem contrárias ao decreto estadual de quarentena ou que incitassem os moradores a não seguirem as determinações. Na visão dos promotores, as publicações de Sodario “ultrapassam o exercício do direito de liberdade de expressão”. Porém, o prefeito seguiu criticando as medidas e passou a detonar o Ministério Público.
Se antes Sodario criticava a vacina, agora seu discurso é outro. Desde dezembro do ano passado, ele vem demonstrando “entendimento” da importância do imunizante. No fim de 2020, gravou um vídeo nas redes sociais dizendo que só permitiria a vacinação que tivesse a aprovação da Anvisa.
Vale destacar que, em outubro, Bolsonaro prometeu que não compraria nenhuma vacina de João Doria. Meses antes, ele havia recusado a compra de doses da Pfizer. Mas, com o aumento de popularidade do governador de SP – que apoiou o presidente em 2018, criando o BolsoDoria – e o clamor popular para que tivesse vacinação em massa em todo país, o “capitão cloroquina” mudou sua postura.
Nem com milhares de mortes e o desastroso comportamento de Bolsonaro mudam o pensamento do prefeito de Mirandópolis. Ao longo da sua trajetória política, compartilhou fotos com armas e com a bandeira de Israel, exaltando o ex-presidente americano Donald Trump, criticando João Doria pelos decretos para combater a Covid-19 e participando de manifestações em apoio ao “mito”, se autointitulando de “Bolsonaro Caipira”.
Bolsonaro tenta ganhar a narrativa que foi defensor da vacina, mas não tem obtido sucesso. Na busca de tirar o protagonismo daqueles que estão preocupados com a vida, tenta impedir que municípios e estados façam consórcios e comprem os imunizantes disponíveis no mercado.
Como Sodario ingressou na Frente Nacional dos Prefeitos (FNP), ele está indo na contramão do discurso do seu “mito”. O consórcio tem 1.703 prefeituras que manifestaram interesse em aderir a compra direta de imunizantes contra a Covid-19. Esses municípios somam mais de 125 milhões de habitantes.
O presidente do consórcio, Jonas Donizette, repudiou recentemente a fala de Bolsonaro, que chamou de “idiotas” pessoas que cobraram a compra de vacinas por parte do Ministério da Saúde, ao dizer que só poderiam comprar “na casa da tua mãe”.
Resta saber se Sodario continuará esbravejando nas redes sociais, mas irá contra o desejo de Bolsonaro, que é impedir os consórcios, ou se voltará atrás e tirará Mirandópolis do FNP. É importante ressaltar que o “capitão cloroquina” também pode perceber que perderá essa guerra contra os municípios e governadores no STF e desistir de barrar o movimento que quer salvar a vida dos brasileiros.