Presidente ganhou eleição, mas não é dono do Brasil. Por Kennedy Alencar

Atualizado em 5 de agosto de 2019 às 20:11
Bolsonaro – Foto: EVARISTO SA

Publicado originalmente no blog do autor

POR KENNEDY ALENCAR

O presidente Jair Bolsonaro tem tratado como pessoal a crítica à sua pretensão de indicar o filho Eduardo Bolsonaro para embaixador em Washington. Não é pessoal. A crítica é à qualificação para o posto nos Estados Unidos.

Bolsonaro repetiu hoje a ameaça de nomear o filho para o Itamaraty se o Senado não aprovar o nome do deputado federal para embaixador. Também voltou a dizer que ganhou a eleição e que o país tem de aceitar suas decisões e discursos.

Bolsonaro ganhou a eleição, mas não é dono do Brasil. Há lei e Constituição a serem respeitadas.

Afirmar que indicaria Eduardo Bolsonaro para substituir Ernesto Araújo no Ministério das Relações Exteriores é uma pressão indevida sobre o Senado, que tem a missão de aprovar a indicação de embaixadores.

O filho do presidente também tem misturado o público e o privado em suas viagens internacionais. Recentemente, ele postou numa de suas redes sociais uma foto com um bilionário da Indonésia segurando um cheque simbólico de R$ 31 bilhões que sugere investimentos diretos no Brasil nos próximos anos. O bilionário é do ramo de celulose.

Só ditaduras transmitem a empresários mundo afora a mensagem de que eles precisam negociar com filhos de presidentes para abrir portas. Só ditaduras tratam missões diplomáticas como se fossem assunto de família.

Apesar de ser presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, não é papel de Eduardo Bolsonaro intermediar eventuais investimentos estrangeiros no Brasil. Isso é assunto do Executivo. Era do Ministério da Indústria e Comércio em governos passados. Hoje, essa estrutura está alojada na pasta da Economia, comandada por Paulo Guedes.

Causa preocupação aos interesses nacionais indicar alguém com o perfil de Eduardo Bolsonaro para a embaixada nos EUA. É mistura assuntos de Estado com interesses familiares. É transmitir a mensagem errada ao mundo, como se o Brasil fosse seguir a trilha de uma república de bananas. É uma cópia fiel, mas ruim de Donald Trump.

Não é bom para o presidente. Não é bom para seu filho. Não é bom para o país.

Teste de fogo

A apreciação da indicação de Eduardo Bolsonaro para Washington será um teste do nosso sistema de freios e contrapesos. O Senado e a imprensa precisam cumprir suas missões institucionais numa democracia. Não é nada pessoal. São assuntos de Estado que estão em jogo.