
A maior crise pública no clã Bolsonaro desde a prisão do ex-presidente já provoca efeitos diretos nas articulações estaduais do PL para 2026. Aliados avaliam que o isolamento de Jair Bolsonaro, hoje detido em uma sala da Superintendência da Polícia Federal em Brasília, começa a comprometer a capacidade de comandar acordos políticos, tarefa que sempre centralizou dentro da sigla.
O episódio mais emblemático, segundo integrantes do partido em relatos à CNN Brasil, foi a briga envolvendo a disputa no Ceará.
A avaliação interna é de que a rotina rígida de Bolsonaro na prisão limita qualquer avanço estratégico. Apenas familiares próximos, advogados e médicos conseguem vê-lo, mediante autorização prévia do Supremo. Não há acesso a celular, redes sociais ou canais fechados. Para aliados, isso impede o ex-presidente de acompanhar a política em tempo real e de orientar ações com base em informações atualizadas.
A crise se agravou no fim de semana, quando Michelle Bolsonaro criticou abertamente a possibilidade de o PL apoiar Ciro Gomes (PSDB) ao governo do Ceará. A ex-primeira-dama disse que não pode apoiar alguém que já atacou seu marido.
A partir daí, o atrito virou conflito familiar: Flávio Bolsonaro acusou Michelle de atropelar decisões já autorizadas por Jair Bolsonaro. Eduardo e Carlos Bolsonaro apoiaram o irmão. Mesmo após pedir desculpas aos enteados, Michelle reforçou críticas ao ex-ministro nesta terça-feira (2), até conseguir vencer o “braço de ferro”.

Ciro tenta retomar protagonismo político após deixar o PDT e se filiar ao PSDB. No Ceará, ele busca apoio da direita, especialmente do PL, para enfrentar o governador petista Elmano de Freitas. O deputado André Fernandes (PL-CE) havia sido autorizado por Bolsonaro, antes da prisão, a dialogar com Ciro sobre uma aliança.
Com o conflito público, a cúpula do PL convocou uma reunião de emergência. Estiveram presentes Valdemar da Costa Neto, Michelle Bolsonaro, Flávio Bolsonaro, Rogério Marinho e André Fernandes. Após o encontro, tentaram transmitir imagem de reconciliação.
“Ficou bem claro que o que a gente identifica foi um ruído de comunicação com a Michelle falando com o coração […] e, do outro lado, a nossa maior liderança no Ceará, o André Fernandes”, disse Flávio.
O senador relatou ainda a dificuldade de comunicação com o pai, afirmando que dispõe de apenas 30 minutos semanais para conversar com ele e que tenta evitar preocupações.
“Ele estava hoje numa situação bem difícil, soluçando bastante, reclamando que teve refluxo à noite. Está numa sala de 12 metros quadrados, trancado na chave o dia inteiro, com a sala ao lado com um barulho infernal do ar-condicionado central daquele prédio da Polícia Federal”, afirmou.
Para reduzir tensões, o PL afirmou que Michelle e Fernandes oraram juntos e posaram ao lado de uma imagem de papelão em tamanho real de Bolsonaro. No entanto, o saldo político aponta uma vitória para Michelle: o partido suspendeu as negociações com Ciro Gomes no Ceará.
O episódio expôs o desafio central do PL: como articular alianças nacionais sem a presença ativa do ex-presidente, principal figura de coesão do bolsonarismo.
Valdemar da Costa Neto tenta preservar pontes com setores do centrão, apostando em pragmatismo para conter as divisões internas enquanto o partido enfrenta o impacto da prisão do seu maior líder.