Prisão domiciliar para Bolsonaro foi decisão branda de Moraes, diz Lenio Streck

Atualizado em 9 de agosto de 2025 às 10:42
O jurista Lenio Streck. Foto: reprodução

O jurista Lenio Streck foi perguntado pela Folha de S.Paulo se o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), acertou em decretar a prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Kakay afirmou que sim, argumentando ainda que houve uma “aplicação branda” e que o réu por tentativa de golpe de Estado “saiu no lucro”.

A resposta foi colocada em contraponto a Guilherme Madeira Dezem, professor de direito processual da USP, que questionou o sistema de Justiça. Leia trechos da argumentação de Lenio à Folha: 

Assim como médicos não celebram a morte, advogados não se alegram com prisões. A liberdade é comparável a um antibiótico: necessária, mas que precisa de controle. Toda democracia tem mecanismos para conter infratores, pois a modernidade rejeita a barbárie. A máxima é clara: a liberdade não é ilimitada.

O episódio recente envolvendo o país não deixa de gerar debate. Mais de 500 réus já foram condenados por crimes relacionados ao 8 de janeiro. Agora, resta verificar a responsabilidade de figuras como Jair Bolsonaro. […]

A decisão da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, relatada por Alexandre de Moraes, evitou a prisão preventiva e optou por medidas menos severas, como a prisão domiciliar. Pela Constituição, a prisão é sempre o último recurso, sendo preferível medidas como recolhimento de passaporte e restrições de circulação. A lei processual prevê exatamente essa gradação, mas, no caso de Bolsonaro, já houve três oportunidades: passaporte apreendido, tornozeleira eletrônica e, por fim, prisão domiciliar em residência confortável em Brasília.

Foto: Divulgação/Assessoria de Jair Bolsonaro

No entanto, ele descumpriu a cautelar. As medidas proibiam o uso de redes sociais, até mesmo por intermédio de terceiros, e determinavam que não saísse de casa nos fins de semana. Ele ignorou as restrições. A consequência lógica, segundo a lei, seria a prisão preventiva. […]

Essa complacência contrasta com o histórico de dezenas de milhares de presos sem direito a tal benefício. Ao mesmo tempo, desde 1889 o Brasil passou por 14 golpes ou tentativas, e há quem veja sinais de uma nova investida. […]

É difícil negar que a democracia esteja sob ataque. Os que a desafiam tentam se valer do direito para enfraquecê-la. Mas o direito de defesa não inclui o direito de agredir instituições. Liberdade não é licença para afrontar o Judiciário, como na peça de Shakespeare em que o filho de Henrique IV desrespeita o juiz — com a diferença de que, desta vez, o juiz prendeu o filho do rei.

A situação é grave. Nenhuma democracia pratica o próprio suicídio institucional. Com suas ações, os Bolsonaros tentam tirar proveito de suas próprias condutas ilícitas, transferindo a responsabilidade para a vítima e, no limite, buscando eliminá-la. Isso é inaceitável.