O PCO (Partido da Causa Operária) é alvo de processos na Justiça por dar calote em seus funcionários. A reportagem do DCM obteve acesso a trocas de mensagens e documentos que mostram golpes de dirigentes da legenda, filhos do fundador Rui Costa Pimenta, em trabalhadores.
Entre 2019 e 2020, enquanto pessoas imploravam por salário, a família Pimenta viajava pela Europa. Um dos filhos postou fotos nas redes sociais de um passeio de 50 dias em Portugal, Itália e Alemanha.
O PCO é subsidiado por doações, venda de jornais e financiamento coletivo em páginas na internet. A legenda afirma, oficialmente, que tem um segundo de tempo de propaganda eleitoral.
Até 2018, o Partido da Causa Operária recebeu R$ 980.691,10 de Fundo Partidário, quase R$ 1 milhão. De acordo com o TSE, o PCO ficou de fora da divisão dos recursos por não cumprir os requisitos fixados na cláusula de desempenho. Essa verba seria, principalmente, para pagar custos e financiamento de campanha política. A legenda, no entanto, não elege nenhum parlamentar desde 2004, quando fez o único vereador de sua história.
“PCO me parecia muito combativo em sua política e muito acolhedor em sua militância, mas com o tempo a convivência vira vigilância, controle e manipulação. Te jogam contra sua família, seus amigos ‘pequeno-burgueses’, seu trabalho e seus relacionamentos”, diz Gabriela Tavares, uma ex-integrante da legenda, ao DCM.
Processos de ex-funcionários
Há ações abertas contra o PCO na 29ª Vara do Trabalho de São Paulo.
Um deles é de 3 de março de 2020, movido por William Terence Dunne contra o Partido da Causa Operária e a Fundação João Jorge Costa Pimenta.
Ele pedia uma indenização de R$ 72 mil por irregularidades no pagamento dos serviços prestados, horas extras e irregularidades no vínculo trabalhista, que deveria ser CLT.
A juíza Luciana Garcia, em 23 de agosto de 2021, deu uma sentença favorável a Dunne, condenando o partido a uma indenização de R$ 75 mil em segunda instância. William Dunne trabalhou por sete anos no PCO.
Outra ação, de Eliane Borges, é movida desde 24 de agosto de 2021, cobrando R$ 40 mil. O processo ainda está aberto.
Outro processo foi aberto por Ezio Medeiros em 12 de dezembro de 2019. Na ação, ele pede R$ 108 mil de indenização.
A juíza Leticia Amaral aplicou uma sentença de R$ 100 mil, mais custas de R$ 2 mil.
Nenhuma das pessoas que entrou na Justiça era militante voluntário do Partido da Causa Operária, e sim ex-funcionários que reclamaram das condições de trabalho.
Funcionário implorou por dinheiro por quatro meses, apontam mensagens
Diálogos de Skype enviados ao DCM mostram um militante chamado Ralfo implorando por dinheiro para João Jorge Caproni Pimenta, filho de Rui Costa Pimenta e seu assessor. As conversas são de 2, 3, 6 e 23 de setembro; 9 de outubro; 11, 15 e 18 de novembro; e 5 e 17 de dezembro de 2019.
“Companheiro JJ [João Jorge] com todo respeito por vossa senhoria: Alguma previsão de quando receberei julho? Hoje é 2 de setembro. Em 8 dias me será devido cobrado”, escreve Ralfo.
O filho de Rui Costa não respondeu. ”Pelo amor de Trotsky!”, roga o militante no dia 3. No dia 23 de setembro ele pergunta se há “solução à vista ou a prazo”.
No dia 9 de outubro, o tom fica mais sério:
“João, eu estou fazendo o possível para cumprir com minhas obrigações. Estou com minha mãe na UTI em um hospital em São José de Rio Preto. Às manhãs eu não tenho conseguido fazer a newsletter, mas à tarde eu tenho escrito duas matérias por dia, atualizando a página do PCO e fiz correção ontem à noite. Amanhã é dia 10 e eu tenho contas a pagar. Eu deixei um bilhete com o Henrique no domingo antes de pegar a estrada, pedindo dinheiro. Dia 10, amanhã, eu intero R$ 5 mil a receber (a descontar R$ 300 para o partido). Eu preciso de dinheiro. Não posso mais seguir sem perspectiva. Me dá alguma coisa, por favor”.
Não há resposta de João Jorge Caproni Pimenta na conversa. No Skype em 11 de novembro, o militante manda um emoji triste e pede: “me responde em nome dos velhos tempos”.
“Oi, não tinha visto suas mensagens. Ainda não consegui o dinheiro. Estou correndo atrás”, diz João Pimenta.
“Tô torcendo para você alcançar”.
Em 18 de novembro, Ralfo diz: “Help!”. João então responde: “Olha Ralfo, eu estou vendo, mas estamos curtos aqui”. E o militante diz: “que coincidência!”.
No dia 17 de dezembro ele pede ajuda “pelo amor de Zeus”.
O silêncio de João Jorge Caproni Pimenta se traduz na conversa com sua irmã mais velha, Natália.
Os diálogos entre os filhos de Rui Costa Pimenta
O fundador Rui Costa Pimenta esteve em viagens pela Europa, distante dos problemas do PCO. Os pagamentos de militantes não eram efetuados e isso foi assunto em conversas de Skype.
Outro filho, Carlos Henrique Caproni, também andava pelo Velho Continente, em países como Portugal, Itália e Alemanha.
Em 5 de dezembro, Ralfo perguntou se João Jorge Caproni poderia dar “alguma ajuda”. No dia 11 daquele mês, João procura Natália Pimenta, que diz: “fala que não vai fazer hoje, que amanhã ou sei lá quando você dá uma resposta mais conclusiva”.
“É melhor ter uma resposta. Vou perguntar para o pai. Jogar para frente de forma indefinida vai abrir uma crise. O cara já é super fresco”, responde João Caproni.
A filha de Rui Costa Pimenta cobra uma resposta de João Jorge Caproni. Ele devolve que vai adiar até o final de uma reunião.
“Mas responde alguma coisa. Isso cria insegurança”, frisou Natália Pimenta.
“Fala que vai ver depois (…). Qualquer coisa. Faz isso. Tenho pós em atrasar pagamentos. Nunca deixe alguém que está te cobrando no vácuo. Ele vai achar que você está fugindo. Vai ficar inseguro e a relação vai piorando”.
A conversa entre os dois adquire um teor mais grave em 29 de janeiro de 2020. E citam pagamentos atrasados de outros militantes do PCO.
“Henrique [Áreas] e Juca [Simonard, hoje jornalista no Brasil 247] receberam o salário de junho?”, pergunta Natália Pimenta em um dos chats. “Não, o Juca nessa crise não arrecadou nenhum centavo”, diz João, que emenda falando que Henrique receberá uma verba previamente acertada.
Natália então responde: “não vou ficar com dois parasitas aqui. Precisamos terminar a reforma do banheiro, pagar contas”.
E a conversa não termina por aí.
João Jorge Caproni então fala a orientação que recebeu de seu pai, Rui Costa Pimenta, sobre os pagamentos pendentes:
“Ele disse que é para mandar eles à puta que pariu (palavras dele). Até ele voltar ao Brasil, ele disse que o pessoal vai ficar sem salário por falta total de dinheiro”.
Natália Pimenta então responde:
“Vou mandar para rua então. Vai abrir crise. Não tô preocupada com eles receberem, tô preocupada com o estrangulamento financeiro da comuna”.
Ela então dá mais detalhes e diz que não é a primeira vez que isso acontece:
“Eu entendi que é o pai [Rui Costa Pimenta] que tá falando, mas não concordo. As pessoas precisam viver de alguma maneira e a gente precisa receber para continuar vivendo aqui (…). Não concordo. No final eu me fodo. Tô com uma casa pela metade, contas atrasadas, IPTU na dívida ativa. Ai vai ficar todo mundo sem salário”.
Natália em seguida detalha meses de atrasos dos militantes, que recebiam R$ 600 por mês.
Parte desses diálogos foram postados no site de denúncia “Partido Censurador Oficial”. O DCM recebeu a íntegra dos diálogos e revela mais detalhes do contexto deles.
Sites de ex-integrantes
Colocado no ar em julho de 2021, o site “Partido Censurador Oficial” faz denúncias de desvios de ética e políticos do PCO, o Partido da Causa Operária. A página foi criada por ex-integrantes desiludidos com os desmandos de Rui Costa Pimenta.
Um documento publicado por egressos do PCO em 2020 relata que Rui costuma tratar militantes que o desagradam por “débil mental”, “inútil”, “cérebro de frango” e “filho da puta” em reuniões.
A publicação é assinada por Alessandra de Lima, Alexandre Barroso, Alexandre Flach, Ana Paula Saliba, Antoanete Madureira, Beatriz Luna, Daniel Edmundo, Chacon Rodriguez, Danilo Matoso, Érika Nunes, Gabriela Tavares, Joaquim Nogueira, Kátia Caldas, Kevin Drummond, Lia Aires, Lúcia Santis, Mikke Nienow, Natalia Campos, Rafael Lucas Brito, Rafael Silva, Samuel Bertolini e Túlio Lisboa.
Essas denúncias ocorrem há pelo menos dois anos. Muitas das pessoas citadas nesta reportagem do DCM temem retaliações do partido liderado por Rui Costa Pimenta. Mas acreditam que é necessário que as informações tornem-se públicas.