Por que o Atlético Paranaense não renovou com a Globo e outros clubes podem fazer o mesmo. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 5 de dezembro de 2017 às 13:05

 

Este texto está sendo republicado a propósito da notícia de que que o Atlético Paranaense recusou a proposta da Globo para transmitir suas partidas pelo Campeonato Estadual do Paraná. O artigo revela algumas razões que justificam a decisão do clube. Os times de futebol são explorados pelo Globo e reféns de sua programação. Com a internet, as correntes podem ser rompidas. 

A Globo é seguramente uma das marcas mais odiadas do Brasil, como se pode ver frequentemente nas redes sociais, em que a hashtag Globo Lixo alcança com freqüência o topo do ranking, e pelas manifestações que volta e meia aparecem na tela da própria emissora — em transmissões jornalísticas ao vivo e agora, num jogo de futebol, o do Atlético Mineiro contra o Grêmio.

A pergunta é: Por que então a emissora se mantém líder de audiência? Um fator é a baixa qualidade das demais TVs abertas, mas isso não explica tudo. A Globo superou a concorrência com práticas desleais, a começar pela sua origem, quando recebeu investimento ilegal de um grupo dos Estados Unidos,  Time Life, e com isso asfixiou a Tupi, líder na época.

No futebol, a Globo mantém o monopólio da transmissão com práticas que também poderiam ser questionadas. A exemplo do que faz com as agências de publicidade, às quais adianta dinheiro das comissões, num prática conhecida por BV — bonificação por volume —, a emissora também é credora de quase todos os times de futebol.

Quando os clubes precisam de dinheiro, a Globo adianta as cotas e mantém o time cativo. Não é por outro motivo que apenas o Palmeiras, hoje o clube financeiramente mais saudável do Brasil, foi único entre os grandes (tem a quarta maior torcida) em condições de dizer não à Globo e assinar com um concorrente, o Esporte Interativo, nas transmissões por TV fechada a partir de 2019.

Segundo o professor Pedro Trengrouse, da Fundação Getúlio Vargas, especialista em marketing esportivo, os clubes são explorados pela Globo. “Nas transmissões por Pay per View, a Globo fica com 70% do valor arrecadado. O que justifica essa elevada margem, se quem atrai audiência é o clube, não a emissora?”, questionou ele, depois de participar de um congresso realizado pelo Sindicato dos Atletas do Estado de São Paulo, no último dia 24.

A Globo alega custos com a transmissão, como equipe, equipamento e outras despesas. No início do ano, os dirigentes do Atlético Paranaense e do Coritiba constataram que não o custo não é tão elevado assim e decidiram fazer eles mesmos a transmissão, através do YouTube e Facebook, e deu certo: mais de 3 milhões de pessoas assistiram ao clássico paranaense ao vivo.

Mas houve quem se colocasse contra essa experiência pioneira, disruptora: a Federação Paranaense de Futebol. A entidade deveria defender os clubes, mas o que fez, ao proibir a entrada ao estádio de técnicos e jornalistas independentes que fariam a transmissão, foi defender os interesses da Globo. É certo que não foi por amor ao logotipo da emissora.

Essa transmissão, adiada em uma semana, acabou acontecendo e mostrou um novo caminho aos clubes:  Por que esperar até 22 horas para o início da partida? Por que obedecer à escala de transmissões da emissora, como se os jogadores fossem do elenco da Globo?

No espetáculo esportivo, a Globo é intermediária e, como todo atravessador, recebe pelo que não faz. E, no caso do futebol, recebe muito.

O blogueiro Rodrigo Mattos, do UOL, fez as contas e chegou à conclusão de que a emissora fatura por baixo R$ 3 bilhões por ano com o futebol — incluindo cotas de patrocínio de TV aberta, assinantes da TV a cabo e Pay per View. Não gasta metade disso com o pagamento pelos direitos de transmissão.

Tornou-se a dona do espetáculo. Define que jogos o torcedor pode ver na TV aberta e em que horário deve ir ao estádio.

A torcida do Atlético Mineiro lembrou em faixas o que aconteceu para Globo alcançar esse poder: “Globo corrupta” e “Paga propina”. O protesto do último domingo ainda é um movimento embrionário — a torcida do Corinthians, há alguns meses, também protestou —, mas esta é uma causa com potencial para crescer.

O torcedor não precisa de intermediário viver a paixão pelo seu clube.