Protestos na França surtem efeito e governo estuda flexibilizar reforma da Previdência

Atualizado em 5 de dezembro de 2019 às 10:54
Cartaz mostrando o presidente francês, Emmanuel Macron, como o absolutista Luís 16, em protesto em Paris – Thomas Samson/AFP

Publicado originalmente no site da RFI

Uma greve contra o projeto de reforma da Previdência paralisa a França nesta quinta-feira (5). A adesão ao movimento é mais forte entre os principais atingidos pelas medidas: ferroviários, professores e funcionários do setor da Saúde. Mas o setor privado também conta com grevistas. Ao meio-dia, havia 120.000 manifestantes nas ruas das principais cidades francesas. O governo já estuda recuar nas etapas de aplicação da reforma.

A França amanheceu em uma atmosfera de protesto contra a reforma das aposentadorias. Cerca de 80% dos trens foram cancelados no país. Em Paris, os ônibus não circulam e 11 linhas do metrô estão fechadas. No setor aéreo, 20% dos voos de curta e média distância foram cancelados. Cerca de 55% dos professores aderiram à paralisação, 78% deles em Paris.

A ideia geral do projeto em discussão é fornecer um “sistema universal de pontos” para substituir os 42 “regimes especiais” existentes. No caso dos ferroviários da SNCF, por exemplo, o acordo da categoria permite solicitar o benefício da aposentadoria aos 50 anos e 8 meses. No novo regime universal, “todo euro contribuído dará os mesmos direitos a todos”, diz o governo.

A poucas horas do início das 245 manifestações organizadas por centrais sindicais em todo o país, o jornal Les Echos publicou uma lista de pontos suscetíveis de flexibilização no projeto. O governo estaria disposto a adiar a aplicação de várias etapas da reforma, afirma o diário econômico.

O projeto não altera a idade mínima legal da aposentadoria, estabelecida atualmente em 62 anos para mulheres e homens. Mas cria a noção de uma idade “ideal” de aposentadoria aos 64 anos, chamada de “idade pivô” pelos franceses, que viria acompanhada de um incentivo financeiro. Quem continuar trabalhando até 64 anos, receberia um bônus na pensão; aqueles que decidirem partir aos 62 anos, receberiam uma pensão menor.

De acordo com o projeto em discussão, esta “idade ideal” de 64 anos seria aplicada aos franceses nascidos depois de 1963. Porém, fontes do governo, segundo o jornal Les Echos, estudam adiar esta programação em dez anos, para aplicá-la apenas aos nascidos depois de 1973. Esse prolongamento, segundo alguns analistas, poderia atenuar as críticas, já que a geração do próprio presidente da República – Macron nasceu em 1977 – estaria entre as primeiras a ser impactada pelas mudanças.

Ambiguidade das autoridades

Outro ponto de discórdia no projeto diz respeito à correção do déficit da Previdência. Os ajustes financeiros no orçamento do sistema, de forma a reduzir seu déficit, previstos inicialmente para 2021 seriam postergados para 2025. Segundo um relatório do Conselho Consultivo para Pensões, o déficit no caixa da Previdência francesa poderá alcançar entre € 7,9 bilhões e € 17,2 bilhões em 2025.

De qualquer forma, uma das principais razões da greve de hoje é que o governo está sendo acusado de ambiguidade por não detalhar concretamente seus planos sobre a reforma. O primeiro-ministro, Edouard Philippe, só divulgará as arbitragens finais na segunda quinzena de dezembro. Duas rodadas de negociação com os sindicatos ainda estão previstas nos dias 9 e 10 de dezembro.

A maior parte dos países europeus já recuou a idade mínima legal da aposentadoria para 65 anos.