Qual vai ser o impacto do fenômeno Bernie Sanders no Brasil? Por Rodrigo Veloso

Atualizado em 18 de fevereiro de 2016 às 9:55
Exemplo para o Brasil: Sanders
Exemplo para o Brasil: Sanders

O artigo abaixo é de Rodrigo Veloso, bacharel em Relações Internacionais (IBMEC-RJ) e um dos administradores da página Barnie Sanders Brasil.

A candidatura do senador Bernie Sanders à presidência dos EUA não é só mais uma pequena etapa do jogo político americano. O que acontece nesse momento no país mais rico do mundo é o despertar de uma juventude que participou ativamente do movimento Occupy Wall Street, da Marcha para o Clima, da revolta racial em Fergunson e que, em vários estados, já havia logrado maior igualdade de direitos para LGBT’s, mulheres e imigrantes.

Sanders, de 74 anos, que era um azarão oito meses atrás, quando lançou sua candidatura, se transformou em referência institucional da efervescência dos movimentos sociais no seu país.

Diante da habitual disputa de personalidades que marca mais uma eleição americana recheada de sobrenomes famosos, como Clinton, Bush e Trump, Bernie aparece como um símbolo de utopia. Seu slogan de campanha é “Não eu, nós”. O seu chamado aos eleitores não é para endossar o tradicional Partido Democrata, pelo qual concorre à indicação para presidente. É para fazer uma “Revolução Política”.

Bernie empresta sua biografia cinematográfica — que inclui uma participação na Marcha de Luther King pelos direitos civis da população negra dos EUA nos anos 60 — para o que existe de mais atual entre as formulações progressistas dos EUA. Em Iowa, primeiro estado a realizar prévias, 84% dos eleitores com até 29 anos optaram por Bernie, ante Hilary Clinton, sua única adversária pela indicação do Partido Democrata.

Da juventude, Bernie tira força para apresentar novidades. É o primeiro autoproclamado socialista a jamais vencer uma etapa estadual para presidente dos EUA. É o primeiro judeu a realizar tal feito, no país com a maior população de judeus no mundo. É um defensor militante da legalização da maconha; do direito ao aborto; da substituição do petróleo por fontes de energia limpa; do acesso universal e gratuito às universidades; e da taxação de grandes fortunas e propriedades.

Quem imaginaria, até Bernie lotar estádios de futebol para comícios de campanha, que um candidato a presidente americano arrastaria multidões com um programa tão avançado?

Provavelmente poucos. No Brasil, falta sintonia com Sanders.

Enquanto Ele já contabiliza em torno de 3 milhões de pequenos doadores individuais que financiam sua campanha, Brasília vê a quase totalidade dos partidos no Congresso envolvida em escândalos de caixa fois e delações de empreiteiros.

Se por aqui o que se vê são concessões cada vez maiores das bandeiras defendidas por movimentos sociais em troca de uma governabilidade precária, nos EUA Sanders prova que o sonho é viável eleitoralmente.

“Quando milhões de pessoas se reúnem e voltam a participar da política, grandes coisas podem ser feitas. Esse país pertence ao povo”, disse Bernie, em dos seus memoráveis discursos que circulam com particular sucesso pelas redes sociais.

Mais do que estratégias de marketing, a lição que se extrai desse veterano que fascina os jovens é a ousadia de dar voz e poder de tomar decisões às bases que constroem sua campanha. De fato, a sua grande aposta tem sido em mobilizar as ruas, contra as poderosas máquinas eleitorais do establishment dos grandes partidos.

Os brasileiros talvez se lembrem de Plínio de Arruda Sampaio, em 2010. Este foi outro idealista teimoso que fez sua mensagem chegar aos jovens. Na mesma linha, nomes como Marcelo Freixo e Jean Wyllys já sabem que seus eleitores não querem dinheiro de bancos e empreiteiras nas suas campanhas e que os movimentos populares devem ser chamados para construir seus programas, não os milionários.

Ainda não se sabe como será o Brasil pós-Operação Lava-Jato. Não se sabia como seria a Itália pós-Operação Mãos Limpas. Mas está mais claro que os interesses do 1% mais rico da população são diferentes, em muito, das necessidades dos 99% que disputam o que sobra das riquezas.

O Brasil observa o fenômeno Bernie Sanders com interesse. Em meio a sua crise de representação, pode ser que algo muito parecido encante os jovens que estiveram nas ruas desde junho de 2013.