
Durante décadas, lideranças da direita brasileira defenderam a bandeira do Estado mínimo e da meritocracia como solução universal. Esse discurso se traduziu em cortes e esvaziamento de programas sociais, sobretudo nas áreas de saúde, educação e habitação. Foi o que ocorreu quando Michel Temer assumiu a Presidência em 2016: o Minha Casa, Minha Vida perdeu fôlego, verba e prioridade. No governo Bolsonaro, a pauta não mudou. O programa habitacional foi relegado ao segundo plano, deixando milhões de famílias sem perspectiva de acesso à moradia subsidiada.
O contraste fica evidente quando se observa a trajetória recente de Roberto Justus. Conhecido por sua defesa aberta da meritocracia e de um Estado enxuto, o empresário e apresentador agora declara que vai “mergulhar de cabeça” justamente em programas sociais de habitação. Desde que adquiriu a SteelCorp em 2023, Justus transformou a construtora em uma potência da construção industrializada, inspirada no modelo chinês de pré-fabricação. Casas de até 54 m², vendidas por valores que variam entre R$ 80 mil e R$ 130 mil, passaram a ser seu principal produto.
A guinada não é apenas retórica. Justus afirma que pretende direcionar até 90% da carteira da SteelCorp ao Minha Casa, Minha Vida e programas similares até o próximo ano. O salto financeiro acompanha o reposicionamento: de R$ 25 milhões em faturamento em 2023, a empresa deve alcançar R$ 330 milhões em 2025, consolidando-se como fornecedora e incorporadora. Para garantir essa expansão, o empresário comprou terrenos e montou uma fábrica capaz de produzir em escala suficiente para faturar R$ 700 milhões anuais.

Se, no discurso político, programas sociais foram criticados por “ferirem a lógica de mercado”, na prática se revelaram um campo fértil de oportunidades. Justus sustenta que não se trata de contradição, mas de estratégia de negócio. “Esse mercado é comprador. Sai governo, entra governo, não importa a bandeira do partido”, declarou em entrevista à Folha. Ainda assim, a entrada de um defensor histórico da meritocracia na engrenagem de políticas públicas de habitação popular expõe o choque entre ideologia e conveniência econômica.
No fim das contas, a retomada do Minha Casa, Minha Vida no governo Lula abriu espaço para que empresários que sempre se posicionaram contra o protagonismo do Estado passem a depender de contratos subsidiados.
A SteelCorp é hoje o retrato de como programas sociais, ignorados pela direita quando se tratava de política, podem se tornar o motor de grandes negócios quando há lucro em jogo.