Que projetos avançaram para evitar novos crimes ambientais como o de Brumadinho?

Atualizado em 23 de janeiro de 2020 às 23:10
Foto: Reprodução/ Twitter

Por Brasil de Fato.

Um ano após o rompimento da barragem I da mina Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG), propriedade da mineradora Vale, o Brasil ainda não conta com uma legislação mais rigorosa para prevenir que novos crimes socioambientais como esse ocorram no país. Considerado um dos maiores desastres ambientais da história do país, o rompimento da barragem em Brumadinho ocorreu no dia 25 de janeiro de 2019, resultando na morte de 272 pessoas, sendo que 11 ainda seguem oficialmente desaparecidas. O episódio também contaminou o rio Paraopeba, um dos mais importantes mananciais que abastecessem a região metropolitana de Belo Horizonte, o que prejudicou pescadores e deixou moradores de várias localidades sem meios de subsistência.

Como forma de aumentar a responsabilização de empresas que constroem barragens, elevando a segurança das populações que vivem nas proximidades, a Câmara dos Deputados aprovou, ao longo do ano passado, quatro projetos de lei sobre o assunto. Incluindo o que tipifica o crime de ecocídio, que é dar causa a grandes desastres ambientais, o que assegura direitos de pessoas atingidas. Os parlamentares também reforçaram mecanismos de fiscalização e maior rigor na política nacional de segurança de barragens. Para que entrem em vigor, no entanto, essas proposições ainda precisam ser aprovadas no Senado Federal e, em seguida, serem sancionadas pelo presidente da República.

“A legislação brasileira é frouxa com as mineradoras e com a proteção do meio ambiente e isso precisa mudar. Várias dessas propostas já vinham desde o rompimento [da barragem] de Mariana [2015], mas a pressão e o lobby das mineradoras é muito forte. Só esse ano, por exemplo, a Vale está pretendendo distribuir, após o crime de Brumadinho, mais de R$ 7,2 bilhões em dividendos para os seus acionistas. O principal acionista da Vale é o banco Bradesco. Então, para ela [Vale], só interessa exportar, sem segurança para as pessoas, com barragens baratas, sem industrializar, sem dar às pessoas condições de usar as ferrovias privatizadas e comprando aço caro do exterior”, afirma o deputado federal Rogério Correia (PT-MG), que foi o relator da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigou o crime socioambiental de Brumadinho.

Em novembro, por unanimidade, a CPI aprovou a sugestão de indiciamento da Vale e da empresa de certificação alemã Tüv Süd (que atestou a segurança da barragem) e de 22 pessoas pelo rompimento da barragem da mina Córrego do Feijão. Já essa semana foi a vez do Ministério Público de Minas Gerais (MP-MG) oferecer denúncia contra o ex-presidente da Vale Fabio Schvartsman, 11 funcionários da mineradora e outros cinco da Tüv Süd. Eles vão responder por crimes como homicídios duplamente qualificados. Caberá à 2ª Vara Criminal de Belo Horizonte abrir ou não o processo criminal contra os envolvidos.

Agora, segundo Rogério Correia, a expectativa é que os PLs aprovados na Câmara também passem pelo Senado. As proposições estão paradas há cerca de quatro meses, mas devem ser retomadas com a volta dos parlamentares após o recesso legislativo, em fevereiro. “Não há justificativa plausível para evitar o acolhimento dos PLs pelos senadores, como demonstram as próprias denúncias anunciadas pelo MP e Polícia Civil do estado, todas em total concordância com o aprovado pela CPI da Câmara”, disse.

Saiba mais sobre o que propõem os Projetos de Lei aprovados na Câmara dos Deputados que endurecem a legislação sobre mineração, construção de barragens e direitos das populações atingidas.

Ecocídio

O Projeto de Lei nº 2.787/2019, aprovado em junho do ano passado, passou a tipificar na legislação o crime de ecocídio, definido como causar desastre ecológico por contaminação ou rompimento de barragens. Segundo o projeto, o crime ocorre quando as pessoas, isso inclui diretamente os dirigentes de empresas, derem causa ao desastre ambiental com destruição significativa da flora ou mortandade de animais.

O texto prevê pena de reclusão de 4 a 12 anos, quando for considerado doloso (com intenção), e de 1 a 3 anos, se for crime culposo (sem intenção).

Direitos dos atingidos

Também em junho do ano passado, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 2.788/2019, que institui a Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB), listando os direitos dessas pessoas. A proposta especifica, por exemplo, que as empresas mineradoras deverão custear um programa de direitos desses cidadãos.

Segundo o texto, o programa de direitos que o empreendedor deverá financiar terá de conter ações específicas destinadas a mulheres, idosos, crianças, portadores de necessidades especiais e pessoas em situação de vulnerabilidade, populações indígenas e comunidades tradicionais, pescadores e trabalhadores da obra.

Terá de lidar ainda com os impactos na área de saúde, saneamento ambiental, habitação e educação dos municípios que receberão os trabalhadores da obra ou as pessoas atingidas por eventual vazamento ou rompimento da barragem. Esse programa de direitos deverá ser aprovado por um comitê local da política nacional dos atingidos por barragens.

Defesa civil

A Câmara aprovou o Projeto de Lei 2790/2019, que reformula o Estatuto de Proteção e Defesa Civil, obrigando as mineradoras a incorporarem a análise de risco ao projeto antes de implantá-lo, incluindo a elaboração de plano de contingência para atividades com risco de acidente ou desastre, realização de simulações periódicas com a população em risco e garantia de recursos necessários à segurança do empreendimento e à reparação de danos à vida humana, ao meio ambiente e ao patrimônio público em caso de acidente ou desastre. A emissão de licença também fica condicionada à aprovação desse plano de contingência.

Segurança de barragens

A outra proposição legislativa que também aguarda aprovação do Senado é o PL 2.791/2019, que altera normas da Política Nacional de Barragens e do Código de Mineração para tornar mais seguros os empreendimentos minerários. Também aumenta o valor das multas, que pode chegar a R$ 1 bilhão, e especifica obrigações dos empreendedores, incluindo a proibição da barragem a montante, o mesmo tipo que ocasionou tanto o desastre de Brumadinho, no ano passado, quanto o de Mariana, em 2015.

Pelo texto aprovado, as atuais mineradoras terão o prazo de três anos para descomissionar as barragens a montante. As mineradoras deverão retirar todo o material depositado no reservatório e na própria estrutura, sendo a área destinada a outra finalidade.

Outros projetos

Ainda em tramitação na Câmara, há outros dois projetos relacionados à questão da mineração. Um deles é um projeto de lei que estabelece regras para o licenciamento ambiental de empreendimentos minerários. Essa medida tramita de forma paralela ao PL 3.726/2004, que estabelece uma lei geral de licenciamento ambiental.

A outra medida é uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que reinstitui a cobrança do ICMS sobre bens minerais primários e produtos semielaborados derivados de bens. Desde a aprovação da Lei Kandir, a exportação de produtos primários agrícolas e minerais é isenta de pagamento de ICMS, um imposto estadual, o que também afeta a arrecadação de estados, especialmente os principais produtores desses bens.

*Com informações da Agência Câmara