A frase “você sabe com que está falando?” é um dos símbolos da cafonice elitista nacional, mas pode ter salvado a judoca Rafaela Silva, que se queixou de sofrer racismo quando o táxi onde viajava do aeroporto até sua casa foi parado pela polícia.
Não é que a medalhista olímpica tenha dito isso aos policiais que a abordaram, mas o fato de ter se identificado como atleta e em seguida reconhecida pelos PMs foi crucial para que ela não sofresse abusos ou extorsões por parte da polícia.
Rafaela relatou a situação no Twitter:
“Chegando hoje no Rio de Janeiro, peguei um táxi pra chegar em casa! No meio da av Brasil um carro da polícia passar ao lado do táxi onde estou e os policiais não estava com uma cara muita simpática, até então ok. (…) daqui a pouco ligaram a sirene e o taxista achou que eles queriam passagem, mas não foi o caso, eles queriam que o taxista encostasse o carro.
Quando o taxista encostou eles chamaram ele pra um canto, quando olhei na janela outro policial armado mandando eu sair de dentro do carro, levantei e sai, quando cheguei na calçada ele outro pra minha cara e falou… trabalha aonde?
Eu respondi… não trabalho, sou atleta! Na mesma hora ele olhou pra minha cara e falou… vc é aquela atleta da olimpíada né? Eu disse… sim, e ele perguntou… mora aonde? Eu falei, em Jacarepaguá e estou tentando chegar em casa.
Na mesma hora o policial baixou a cabeça entrou na viatura e foi embora! Quando entrei no carro novamente o taxista falou que o polícia perguntou de onde ele estava vindo e onde ele tinha parado pra me pegar. E o taxista respondeu… essa é aquela de judô, peguei no aeroporto e o polícia falou… ah tá! Achei que tinha pego na favela.
Isso tudo no meio da av Brasil e todo mundo me olhando, achando que a polícia tinha pego um bandido, mas era apenas eu, tentando chegar em casa.”
Houve que achasse exagero da atleta em se sentir constrangida e alguns poderão não ver sentido na ideia de que a fama de Rafaela tenha a ajudado a não sofrer uma abordagem mais truculenta. A própria Polícia Militar do Rio de Janeiro emitiu uma nota onde chama de “injustas” as declarações da judoca.
Mas um vídeo feito pelos youtubers AD Júnior, Spartakus Francisco e pelo jornalista Eduardo Carvalho com orientações para seguir durante abordagens policiais está aí para lembrar que não é força de expressão afirmar que Rafaela escapou do pior.
As orientações podem evitar a repetição de casos como os de Vinícius Romão, preso por engano, Rafael Braga, detido por carregar uma garrafa de desinfetante, e de Amarildo Dias de Souza, morto e até hoje desaparecido depois de ser conduzido pela PM do Rio de Janeiro em 2013.
No vídeo, destinado a negros e produzido após o anúncio da intervenção federal no Rio de Janeiro, há dicas como andar com a nota fiscal de celulares ou equipamentos eletrônicos caros, avisar aos policiais movimentos de pegar carteira ou outro objetos, andar com os documentos e manter amigos ou parentes informados dos locais por onde for passar.
Caso atualizem o vídeo no futuro, os rapazes poderão lembrar aos atletas negros que andem com suas medalhas e outras provas das conquistas esportivas. Em meio a incontáveis casos de abusos das forças policiais contra pessoas pretas e pobres, um simples recorte de jornal pode salvar uma vida.