‘Rainha do Brasil’: idosa que viralizou ostentando é a cara do Brasil de Bolsonaro

Atualizado em 28 de agosto de 2022 às 16:56
Maria Berklian, apelidada de “Rainha do Brasil”
Foto: Tik Tok/Reprodução

Maria Berklian, de 84 anos, viralizou no TikTok e já acumula mais de 1 milhão de seguidores com o bordão “tá barato!”, que a idosa usa nas lojas mais luxuosas de São Paulo.

Ela se apresenta como a “rainha do Brasil” e brinca ser prima de Dom Pedro I.

Suas redes sociais são geridas pelo neto, Eduardo Berklian, que contou a história da avó ao G1.

“Minha avó começou na adolescência mesmo como costureira e feirante. Batalhou bastante. Após se casar, ela e o meu falecido avô conseguiram montar uma rede de supermercados, que cresceu e depois foi vendida há 30 anos. O negócio deu conforto para todos”, explica.

Senta lá, Cláudia.

Segundo ele, o bordão “tá barato” sempre existiu e a família não imaginava que faria tanto sucesso.

Mas de onde vem a popularidade que Maria Berklian não esperava?

No limite entre realidade e humor fantasioso, a idosa bomba no TikTok por gastar uma fortuna em joias, bolsas e carros importados. “Fala a verdade se não tá barato?” perguntam as vendedoras diante dos valores exorbitantes.

A única pergunta que me ocorre é: por que isso tem graça em um país onde as pessoas passam fome?

Longe de mim ser a chata que questiona memes, mas o sucesso de uma figura pitoresca como a tal “rainha do Brasil” me soa como uma celebração à desigualdade, para além da cafonagem sem tamanho que é celebrar monarquia em um país colonizado. Desculpem, mas eu não rio de tudo.

Aliás, as coisas das quais você ri dizem muito sobre você.

Ao contrário do que o neto e idealizador das redes sociais de Berklian tenta fazer parecer, o sucesso não é um acaso: existe uma linha de conteúdo no TikTok (e no Instagram, também) que consiste basicamente em ostentação – ok, sem a parte do cosplay de rainha.

No Brasil, você pode fazer sucesso e ficar ainda mais rico apenas por… ser rico.

Amigas, esta senhora gasta valores inimagináveis em produtos que eu sequer sabia que poderiam ser tão caros, usa bolsas que valem carros e carros que valem casas e tapeçarias que valem carros e casas juntos.

Quem é o público desse tipo de conteúdo?

O mesmo que segue e admira gente como as Kardashains, Dra Deolane e outras ostentadoras sem muito conteúdo a oferecer. Para o brasileiro, é aceitável que alguém fique ainda mais rico ostentando relógios de duzentos mil reais enquanto outros brasileiros não têm o que comer.

Esse é um sintoma de que há alguma coisa muito errada com o público das redes sociais, que apreciam um conteúdo fantasioso, vazio e – desculpem – sem graça.

Não existe Família Real no Brasil. Autointitular-se prima de Dom Pedro I não é engraçado, mesmo que você seja uma idosa fofinha de 84 anos.

Vivemos em um país colonizado e de terceiro mundo, e ostentar status nas redes sociais não deveria ser conteúdo viral: deveria ser tratado mais ou menos como o coroa da “bebida que pisca” – como esquecer? – algo simplesmente ridículo e fora da realidade, que não merece nenhum ibope além da zoeira.

Mas, hoje, ao que parece, a idiotização das mídias sociais atingiu seu ápice, e se tornou engraçado ser rico cafona em um país paupérrimo.

Fiquem à vontade pra rir: eu continuo achando apenas patético.

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Nathalí Macedo
Nathalí Macedo, escritora baiana com 15 anos de experiência e 3 livros publicados: As mulheres que possuo (2014), Ser adulta e outras banalidades (2017) e A tragédia política como entretenimento (2023). Doutora em crítica cultural. Escreve, pinta e borda.