Raio X do comércio: como criar expectativas positivas. Por Luis Nassif

Atualizado em 2 de janeiro de 2020 às 21:31
Dinheiro. Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil/Agência Brasil

Publicado originalmente no GNN

Por Luis Nassif

Um dos instrumentos políticos de maior eficácia, na formação de expectativas, é o uso seletivo de indicadores da economia. Vamos ver, didaticamente, como funciona esse mecanismo, através da analise dos dados do comércio, usando as pesquisas da Confederação Nacional do Comércio e os dados do IBGE.

Peça 1 – os indicadores de expectativas dos consumidores

A CNC tem duas pesquisas mensais: uma com os comerciantes, outra com os consumidores. Há uma série histórica que permite comparar períodos distintos. Em geral, os jornais divulgam apenas as variações do mês em relação ao mês anterior.

Primeiro, vamos comparar as expectativas das famílias em dois momentos. A última, de dezembro de 2019, comparado a janeiro de 2015. A segunda, em relação a dezembro de 2018.

Início de 2015 marcou o início do profundo pessimismo que chacoalhou a economia brasileira, facilitou as manifestações de rua que culminaram com o impeachment.

Mesmo assim, todos os indicadores de expectativa das famílias eram melhores do que os de dezembro de 2019.

Vamos a uma comparação mais próxima: com dezembro de 2018. Houve uma piora em todos os indicadores de expectativas das famílias.

Peça 2 – as expectativas do comércio

Em países racionais, sem viés na cobertura da mídia, as expectativas dos consumidores do comércio deveriam acompanhar as expectativas dos comerciantes.

Analise os gráficos.

Analise 1 – Todos os indicadores de expectativas superam largamente a avaliação do momento presente.

Analise 2 – comparando com dezembro de 2018, todos os indicadores sobre a situação presente tiveram queda. Mas todas os indicadores de expectativa mostraram alta. Ou seja, é uma crença que não bate com os resultados presentes.


Analise 3 – Na comparação com os consumidores, mesmo todos os indicadores dos consumidores estando a cima de 100, todos os indicadores dos comerciantes estão muito abaixo dos 100.

Peça 3 – expectativas x realidade

Vamos fazer duas comparações: primeiro, o da avaliação do presente x expectativas futuras. As expectativas enormemente superiores à avaliação do presente.

Análise 1 – o índice de expectativa do comércio

Junho de 2013 marcou o auge do crescimento da economia. Mas o jogo de pessimismo da mídia estava a pleno vapor. Hoje em dia, com a situação muito pior, todos os indicadores de expectativas do comércio estão acima daquele ponto, mostrando o extraordinário poder da mídia em formar expectativas, mesmo em cima de dados negativos da realidade.

Análise 2– expectativa x resultado concreto

A linha pontilhada mostra o índice de expectativa do comércio. As demais, são setores relevantes do comércio apresentados com uma defasagem de 6 meses em relação às expectativas. Tomou-se abril de 2013 como base 100.

Há um dados bem interessante a se observar.
No período 2015 até primeiro semestre de 2016, as expectativas andam sistematicamente abaixo dos resultados objetivos dos principais setores. A partir do impeachment, as expectativas passam a caminhar acima dos resultados.

A explicação está na cobertura econômica da mídia.

Na fase de terrorismo, o Jornal Nacional chegou a dar uma semana de cobertura sobre a explosão dos preços do tomate. Fez até matérias preconizando a volta da maquininha de remarcar. Agora, com a explosão dos preços da carne – que tem um peso muito maior do que o do tomate – foi uma cobertura normal.

Esse jogo forçado de expectativas está na base do apoio do empresariado a Bolsonaro e às tais reformas.