“Realidade é combustível para literatura”, diz autor brasileiro de ficção sobre evangélicos. Por Silvano Mendes

Atualizado em 27 de dezembro de 2019 às 20:58
Capa do livro de Victhor Fabiano, que tem como pano de fundo a influência das igrejas pentecostais no Brasil. Divulgação

Publicado originalmente no RFI:

POR SILVANO MENDES

O escritor Victhor Fabiano lançou em 2019 o livro Igreja da Vila. A ficção, ganhadora de um edital da prefeitura de São Paulo, conta a história de uma disputa política que tem como pano de fundo a influência das igrejas pentecostais no Brasil.

O escritor de 22 anos é formado em Sociologia. Igreja da Vila é o seu quinto livro. “Foi muito interessante escrever esse livro, casou bem com o momento político brasileiro. Falo sobre a influência religiosa na política”, conta o autor. “Não apenas a influência religiosa histórica na construção do Estado brasileiro, mas também na história recente, principalmente após a Constituinte, nos grupos evangélicos pentecostais”, conta.

“O livro não se passa no Brasil”, avisa Fabiano. “É um ambiente fictício construído. Mas esses retratos brasileiros, tanto da sociedade quanto da organização política, também estão presentes no enredo”, diz. O autor aborda não apenas a questão da igreja evangélica, mas também escreve sobre a católica. “Tenho a intenção de mostrar não apenas os bastidores, mas como acontece essa luta política, essa luta religiosa que se tornou política”, especifica.

No livro, a Vila São José de Assunção, onde se passa a história, foi construída pelas mãos de um padre, que estabeleceu o vilarejo ao redor da paróquia. “Todo o poder, familiar e político, dessa vila se direciona para a paróquia. Existe uma família ligada à igreja que domina os negócios. Com a morte de um de seus principais nomes, acontece um vácuo, que é aproveitado pelos interesses da igreja pentecostal”, afirma.

“O livro fala sobre esse processo, como se trabalha politicamente para conseguir atingir o poder religioso católico da vila e construir um poder evangélico”, diz. “Desenvolvo a trama com um trabalho narrativo. O final mostra uma transformação desse poder, que troca de grupo. O interessante é a percepção do enredo sobre como isso acontece, ao longo do tempo”, diz.

Victhor Fabiano conta que começou a escrever o livro Igreja da Vila em 2017. “Já estava sendo escrito bem antes da eleição e dos burburinhos sobre os candidatos”, lembra. “No mundo real, percebemos às vezes movimentações tão absurdas, que tentamos encaixá-las na ficção. Se não for feito com muito cuidado e com muita habilidade, o texto ficcional pode parecer forçado, mesmo que no mundo concreto aquele acontecimento ocorra”, avalia o autor.

“A realidade é um combustível importante para a literatura. É esse combustível que eu tenho usado, desde o meu primeiro livro. O interesse pela política, não só na minha formação, como também na escrita, tem a intenção de mostrar para as pessoas que, pela literatura, a gente também consegue falar sobre os problemas da realidade e sobre os limites que o pensamento às vezes tem, em relação ao acesso ao conhecimento e à educação, que, infelizmente, ainda é muito comum no Brasil”, diz Fabiano.