Reflexão sobre a morte, por quem dela esteve muito perto. Por Afrânio Silva Jardim

Atualizado em 28 de agosto de 2021 às 16:14
Afrânio Silva Jardim – Foto: Reprodução/Facebook

Reflexão sobre a morte, por quem dela esteve muito perto

Por Afrânio Silva Jardim

1) – Começo asseverando: quem morre não descansa; quem morre nada faz …

Sempre repudiei algumas expressões muito comuns diante da morte de uma pessoa.

Agora, com as letais consequências da pandemia do Covid-19, este meu “bizarro desconforto” se acentuou. Talvez por falta de melhor inspiração, digo alguma coisa sobre isso. Gosto da polêmica.

Inicialmente, rejeito a expressão: “vida que segue”, após burocrático lamento pela morte de alguém.

Esta expressão – vida que segue – denota que o lamento não é tão sentido ou sincero assim. A morte, neste caso, parece que foi absorvida ou ultrapassada muito rápido … Para quem gostava da pessoa morta, a vida segue muito diferente e de forma dolorosa.

Entretanto, minha contrariedade mesmo é com a expressão: “descanse em paz” ou “vai em paz”. Esta contrariedade tem algum fundo “filosófico”.

Para mim, a morte é simplesmente o fim da vida. A morte é simplesmente a ausência de vida.

Talvez possamos dizer que a “morte não existe” ou que a morte somente existe porque ela nega a existência da vida …

Levando em linha de conta essa premissa, que tem total apoio no conhecimento científico e afasta os vários mitos de cunho religioso ou místico, fica claro que o morto não descansa; o morto não pratica condutas, mormente aquelas próprias de quem tem vida.

Pode-se dizer, sim, que o morto não mais se cansará, como ocorria enquanto vivia…

Por estes motivos, fica mais ilógico ainda postular que o morto “vá em paz”. Na verdade, o morto não vai a lugar nenhum, salvo nos filmes de terror.

Como costumo dizer, a morte é um nada. A “situação” do morto é igual àquela de antes de ele ter nascido. Não existia e deixou de existir. A única diferente é que agora temos um corpo, que será descartado, que se transformará em pó.

Com a morte das pessoas, elas simplesmente acabam, deixam de existir. O morto não tem consciência, por isso, o morto não sabe sequer que morreu… O morto nada mais sabe.

A origem e o ocaso do ser humano são exatamente iguais ao nascimento e ao destino dos demais animais. Somos fruto da evolução das espécies e todas nascem e morrem de acordo com as “regras” da natureza.

Nada mais além disso restou provado pela ciência. Não tenho motivo para acreditar naquilo que não está provado.

Em outra perspectiva, podemos dizer que a morte é ruim quando a vida é boa … Acho que a recíproca também é, de certo modo, bastante verdadeira.

Assim, com a necessária cautela e segurança, sou totalmente a favor da eutanásia.

Entretanto, felizmente, ficam para os que permanecem vivos as lembranças dos momentos vivenciados no passado com aquele que agora está morto e o resultado de seu labor, incluindo suas ideias e suas realizações mais marcantes.

Saudades nos confortam, mas também nos fazem sofrer.

Saudades do meu pai e da minha filha. Viveram digna e intensamente. Devo muito a ambos …

2) – NÃO ME DESESPEREI !!!

Tendo sobrevivido à Covid-19, escrevi este pequeno texto, que ora publico, para que não caia no esquecimento:

Quando o meu médico disse que eu seria intubado, sabia que poderia não mais acordar, que poderia deixar de viver. Ainda acho estranho, mas fiquei tranquilo e conformado.

Comuniquei a situação à minha filha Júlia e não consegui falar com a minha esposa Elyeth (ela estava falando com o médico). Sabia que poderia ser uma despedida, mas não dei esta conotação. Continuava aceitando toda esta dramática situação com serenidade.

A partir daí, só me lembro de estar sendo “acordado” pelo médico, Dr. Fernando Azevedo, sem noção alguma do tempo em que fiquei intubado (seis dias).

Os piores dias foram o que se seguiram, amarrado na cama (primeiro dia) e totalmente dependente do auxílio de terceiros para os movimentos e atos mais comezinhos.

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Recuperação

Agora, estou me recuperando bem e já ando sozinho, estando fazendo fisioterapia; (neste exato momento, 28 de agosto, estou totalmente recuperado).

Toda esta agonia nos impacta e nos provoca novas reflexões, que publicarei oportunamente. Devo a muitas pessoas o fato de estar vivo e isto também será objeto de novas mensagens.

Agradeço a meus leitores pelas mensagens amigas que recebi.

(Texto originalmente publicado no Facebook do autor)