Regina Duarte já lutou ao lado dos democratas contra a ameaça de um Hitler tropical. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 23 de janeiro de 2020 às 7:30

O vídeo acima é a demonstração cabal de que Regina Duarte nem sempre foi a reacionária que agora se apresenta, disposta a servir a um governo de extrema direita, de traços nitidamente fascistas e com setores que flertam com a sua vertente mais radical, o nazismo.

Foi gravado em 1985, provavelmente a pedido de seus amigos no PMDB que, mais tarde, abririam uma dissidência e fundariam o PSDB. Era a época da campanha pela prefeitura de São Paulo, na primeira eleição depois do golpe de 1964.

A atriz tinha sido um dos destaques na campanha pelas eleições diretas, o movimento que levou os militares de volta para os quartéis — os mesmos que o então capitão Jair Bolsonaro queria que continuassem governando o país.

“Acho que temos de fazer isso para impedir que as forças da corrupção e da ditadura voltem a se juntar e destruam a nossa frágil democracia. Não vamos nos esquecer também do que aconteceu na Alemanha na década de 30. Os democratas se dividiram e o que que aconteceu? Hitler subiu ao poder com pouco mais de 30 por cento dos votos”, disse.

O discurso se encaixava no argumento de Fernando Henrique Cardoso, então candidato a prefeito. Senador na época, ele defendia a renúncia de Eduardo Suplicy, candidato do PT, para evitar a vitória de Jânio Quadros, o candidato da direita.

O PT manteve a candidatura, o que se revelou uma decisão acertada. Três anos depois, Luiza Erundina se elegeria, para realizar uma gestão que é reconhecida como uma das melhores da história de São Paulo.

Fernando Henrique Cardoso, nove anos depois, se aliaria à direita nacional, representada pelo PFL, para realizar o governo dos sonhos da elite do atraso: juros nas nuvens e muita privatização.

Em certo sentido, continuidade do governo de Fernando Collor e precursor do projeto de Michel Temer e de Jair Bolsonaro.

Mas Regina Duarte não podia adivinhar. Aquela era a turma dela, que havia, efetivamente, combatido a ditadura militar. Seu ex-marido, o diretor de TV Daniel Filho, contou que ela era de esquerda.

Na época, um amigo, o sociólogo Emir Sader, foi o interlocutor junto a Fidel Castro para que ele a recebesse. E a visita foi um sucesso. Para ambos. Regina Duarte sempre foi muito popular em Cuba, primeiramente em razão de Malu Mulher e depois por conta de Vale Tudo.

Na eleição presidencial de 1989, Regina Duarte fez campanha para Mário Covas no primeiro turno e votou em Lula, no segundo, contra Fernando Collor.

Em 2002, ela foi para a direita, atraída pela ala paulista do PSDB, que a convenceu a gravar um discurso ridículo de que tinha medo da vitória de Lula.

Era a cartada final de José Serra, que parecia desesperado diante da vitória iminente de Lula. E o que aconteceu? Lula ganhou e cumpriu dois mandatos, que terminaram com a melhor avaliação que um presidente brasileiro já teve: 87% dos eleitores consideraram sua gestão ótima ou boa.

Regina Duarte talvez compartilhasse dessa avaliação, mas a ponte que a unia a setores progressistas da sociedade havia sido implodida. Em 2014, ela vestiu camisa amarela da Seleção e foi para a Paulista reverenciar o Pato da Fiesp.

Em 2018, apoiou Bolsonaro e agora está prestes e embarcar no projeto que guarda semelhança com o que aconteceu na década de 30 na Alemanha.

Como ela mesma advertiu um dia, os democratas se dividiram e Bolsonaro subiu ao poder, ops, Hitler subiu ao poder.