Relator da ONU pede que países adotem renda básica universal com pandemia de coronavírus

Atualizado em 22 de março de 2020 às 9:43

Publicado originalmente no site da Organização das Nações Unidas (ONU)

A melhor resposta a uma potencial catástrofe econômica e social provocada pela crise da COVID-19 é colocar as finanças a serviço dos direitos humanos e apoiar os menos favorecidos por meio de abordagens financeiras ousadas, disse nesta sexta-feira (20) um especialista em direitos humanos da ONU.

“Estímulos fiscais e pacotes de proteção social direcionados aos menos capazes de lidar com a crise são essenciais para mitigar as consequências devastadoras da pandemia”, disse Juan Pablo Bohoslavsky, especialista independente da ONU sobre os efeitos da dívida externa nos direitos humanos.

“Peço aos governos que considerem a introdução de uma renda básica universal de emergência.”

“Estou encorajado com o fato de que muitos países estejam contemplando medidas de estímulo econômico em larga escala. No entanto, essas medidas devem ser cuidadosamente projetadas para garantir que sua principal contribuição vá muito além de apenas resgatar grandes empresas e bancos”, afirmou ele.

“É essencial que os serviços públicos sejam prestados gratuitamente a quem não puder pagar. O serviço da dívida deve ser suspenso para indivíduos que, de outra forma, não conseguiriam lidar com a crise de saúde pública. Despejos em massa devem ser absolutamente evitados”, pediu o especialista independente.

“Os que trabalham no setor informal, que trabalham por conta própria e não podem trabalhar em casa precisam de incentivos econômicos e fiscais para ficar em casa. Caso contrário, eles precisarão ir ao trabalho e, assim, colocar em risco sua saúde pessoal e familiar e daqueles na comunidade em geral”, afirmou.

Observando que a recessão global que está se desenrolando pode ser um desastre não mitigado ou uma oportunidade para soluções inovadoras, o especialista da ONU instou os governos a estruturar suas políticas econômicas relacionadas à COVID-19 de acordo com os “Princípios Orientadores sobre os Efeitos das Reformas Econômicas nos Direitos Humanos“.

“Nos últimos anos, testemunhamos as conseqüências adversas da comercialização e privatização de vários serviços essenciais, incluindo assistência médica e saúde pública. As chamadas políticas de ‘economia de custos’ foram implementadas em muitos países. Esses desenvolvimentos devem ser revertidos com urgência para que os Estados possam respeitar os direitos humanos e os desafios fiscais colocados pela crise da COVID-19”, afirmou Bohoslavsky.

De acordo com o especialista independente, acordos de dívida e direitos de propriedade (reais, pessoais e intelectuais) existem em um universo jurídico e social mais amplo, no qual a lei de direitos humanos deve prevalecer.

Se devidamente justificado, os Estados podem adotar as medidas econômicas e jurídicas necessárias para enfrentar com mais eficácia a atual crise da saúde. Em particular, nenhum direito econômico privado deve superar os direitos do público à saúde e à sobrevivência.

O especialista independente também instou as instituições financeiras internacionais a mobilizar urgentemente seus recursos financeiros para ajudar os países a combater a pandemia.

“Estou profundamente preocupado com a recente resposta do FMI ao pedido de apoio financeiro da Venezuela para lidar com a crise da COVID-19. O argumento do FMI sobre a falta de ‘clareza’ no reconhecimento internacional do governo da Venezuela não pode ser a base de uma decisão que põe em risco toda a população venezuelana e, em extensão, o mundo inteiro. Essas decisões podem resultar em grave violação dos direitos humanos e exigiriam responsabilidade da instituição e de seus decisores”, afirmou Bohoslavsky.

“Esta crise é uma oportunidade para refletir e reverter a ideologia segundo a qual o crescimento econômico é o único caminho a seguir. Em particular, nos pede que questionemos e alteremos nossos padrões e comportamentos de consumo, se levarmos a sério a tentativa de garantir os direitos humanos para todos e a proteção do meio ambiente”, concluiu Bohoslavsky.

Os relatores especiais fazem parte do que é conhecido como Procedimentos Especiais do Conselho de Direitos Humanos. Procedimentos Especiais, o maior órgão de especialistas independentes no sistema de Direitos Humanos da ONU, é o nome geral dos mecanismos independentes de pesquisa e monitoramento do Conselho que abordam situações específicas de países ou questões temáticas em todas as partes do mundo.

Especialistas dos Procedimentos Especiais trabalham voluntariamente; eles não são funcionários da ONU e não recebem salário por seu trabalho. Eles são independentes de qualquer governo ou organização e servem em sua capacidade individual.