Relatório da PF sugere influência dos métodos do crime organizado sobre os militares

Atualizado em 25 de novembro de 2024 às 20:03
O general Walter Braga Netto foi apresentado como interventor federal em 2018. Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

O relatório da Polícia Federal revelou um cenário preocupante sobre a atuação de militares nos atos investigados, com 25 dos 37 indiciados possuindo patentes nas Forças Armadas. Esse número expressivo indica um envolvimento significativo de militares em ações que sugerem a possibilidade de um golpe. Embora não se possa afirmar categoricamente que houve uma tentativa de golpe militar, o levantamento aproxima essa compreensão e traz à tona a gravidade da situação.

Entre os aspectos mais alarmantes apontados no relatório está a conexão entre os métodos empregados nas ações golpistas e aqueles usados no assassinato de Marielle Franco. A Polícia Federal identificou uma “transferência de tecnologia” entre as práticas do crime organizado e as estratégias militares, um fenômeno que sugere contaminação. Essa conexão fica ainda mais evidente com a presença do general Braga Netto em ambos os contextos.

Antes de ocupar altos cargos no governo Jair Bolsonaro, incluindo a vice-presidência na chapa de reeleição, Braga Netto comandou a intervenção militar no Rio de Janeiro durante o governo Temer. Nesse período, sob o pretexto de garantir a segurança pública, práticas controversas foram adotadas. A militarização da segurança pública, longe de resolver os problemas locais, teria promovido a incorporação de métodos ilícitos, que hoje preocupam as investigações.

O relatório aponta que o monitoramento de alvos políticos, como Lula, Geraldo Alckmin e Alexandre de Moraes, teve início após uma reunião na casa de Braga Netto. Entre os envolvidos estava Mauro Cid, membro das Forças Especiais do Exército, treinado em contraterrorismo e sabotagem, que desempenhou um papel central no planejamento e execução de ações, incluindo o uso de celulares registrados em nomes de terceiros para dificultar o rastreamento.

Um elemento-chave das investigações foi o documento conhecido como “Apostila de Anonimização”, encontrado nos arquivos do coronel Rafael Oliveira. Esse material detalha técnicas para escamotear ações ilícitas e faz referência direta às práticas utilizadas no caso Marielle Franco. As investigações revelaram que os métodos de anonimização foram inspirados em estratégias do crime organizado, como o uso de dados de antenas celulares, que permitiram identificar os assassinos da vereadora. A evidência desse vínculo entre as práticas criminosas e as operações golpistas reforça o caráter perturbador das descobertas.

A vereadora Marielle Franco, assassinada no Rio de Janeiro em 2018. Foto: Reprodução

A divulgação do relatório gerou reações variadas. Braga Netto repudiou as acusações e criticou o relatório, enquanto membros do Exército defenderam que parte das informações se baseia em fontes questionáveis. Apesar de iniciativas como a diretriz ética proposta pelo general Richard Nunes, outras medidas necessárias para mitigar a influência militar na política, como a limitação de cargos civis ocupados por militares, ainda enfrentam resistência.

O Exército também enfrenta dificuldades para investigar militares suspeitos de forma eficaz. Procedimentos mais rigorosos, como a quebra de sigilo, dependem de autorização judicial, limitando as investigações a sindicâncias de alcance restrito. Muitos dos indiciados, incluindo Mauro Cid, operaram por meio de relações pessoais construídas nas academias militares, o que dificultou a identificação de suas atividades clandestinas.

Por fim, os indiciamentos destacam o impacto desse cenário no futuro das Forças Armadas. Oficiais como o general Nilton Diniz Rodrigues e o coronel Fabrício Bastos, ocupando posições estratégicas, tornaram-se alvos das investigações, expondo a fragilidade institucional em lidar com infiltrações golpistas. A incapacidade de impedir que integrantes da corporação usem sua expertise militar para ameaçar o próprio Estado levanta preocupações sobre a credibilidade e o papel das Forças Armadas no regime democrático.

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