A declaração de Renato Aragão de que gays e negros não se ofendiam com as piadas dos Trapalhões provocou repúdio dos defensores das minorias e apoio dos inimigos do “politicamente correto”. Se por um lado ele foi chamado de “babaca” e “imbecil” no Twitter, por outro foi tema de artigo elogioso de colunista reacionário da Veja.
As duas reações são exageradas. Quem, com toda a sinceridade, poderia esperar que Renato Aragão, beirando os 80 anos, emitisse uma opinião crítica em relação ao racismo e outras formas de discriminação? Ele fez humor sem incomodar a ditadura, sempre esteve alinhado com a Rede Globo e em entrevistas recentes admitiu que as piadas do seu grupo seriam mal vistas hoje em dia.
A sua fala, em depoimento à revista Playboy, manteve a superficialidade e a abundância de lugares comuns que caracterizam a sua produção artística. Com a diferença que é insossa. Manifestações de repúdio sobre seu ponto de vista seriam válidas se o ex-Trapalhão fosse um exemplo de engajamento social e político (Criança Esperança não vale!), mas ele nunca foi. Neste caso, vale a velha frase do escritor Barão de Itararé: “de onde menos se espera, daí é que não sai nada”.
Renato Aragão é café com leite. Sua opinião sobre a discriminação sofrida por gays e negros é tão relevante quanto a de Xuxa sobre o novo ministro da Fazenda.
Isso não impediu que o articulista Felipe Moura Brasil igualasse Renato Aragão a Danilo Gentili como soldado na luta contra o politicamente correto. Deu até tristeza ver o Didi Mocó ao lado de um sujeito que usa o humor como desculpa para disparar ofensas e espalhar preconceitos. Sem contar que os Trapalhões eram bem divertidos, ao contrário do Gentili.
A melhor resposta ao artigo oportunista da Veja vem do próprio trapalhão. Em junho de 2011, em entrevista a Marcelo Zorzanelli na revista Alfa, o trapalhão afirmou que o humor do grupo tinha a ver com o ambiente social da época. “Que intenção eu tenho de ferir negros, feios, gordos, homossexuais? O que eu quero é conquistá-los, quero que vejam meu programa. Hoje, com esse avanço da sociedade, acho que fica muito difícil fazer esse humor despreocupado que a gente fazia. Porque mesmo sem intenção, você pode estar ferindo”.
Seria um depoimento como tantos outros, não fosse uma frase palavra ignorada pelos que reclamam da impossibilidade de fazer humor hoje em dia: “avanço da sociedade”. Se não dá mais para fazer piada sobre certos assuntos, é porque a sociedade avançou. Ponto final.
Se o Renato tivesse lembrado desta entrevista com três palavrinhas mágicas, teria escapado da trapalhada em que se meteu. E não teria o dissabor de servir de escada para articulistas que não veem nada de errado em fazer piadinhas preconceituosas.