
A decisão de Donald Trump de retirar as tarifas de 40% sobre parte dos produtos brasileiros foi recebida com alívio pelo governo do Brasil, mas também com uma leitura pragmática do cenário interno dos Estados Unidos. Como relatou o jornalista Jamil Chade, no Uol, a avaliação em Brasília é de que o gesto do presidente americano está diretamente ligado ao aumento da inflação no país, especialmente nos preços de alimentos.
O governo brasileiro considerou a medida “positiva”, mas não a interpreta como concessão definitiva. Pelo contrário, o Itamaraty vai seguir pressionando para que todas as tarifas impostas desde julho sejam suspensas temporariamente enquanto avança a negociação de um acordo comercial mais amplo entre os dois países. A expectativa é que as conversas se intensifiquem nos próximos meses.
Uma das justificativas apresentadas pelo Brasil é o histórico positivo para os Estados Unidos na balança bilateral. Segundo Chade, diplomatas brasileiros argumentam que “os americanos contam com um saldo positivo na balança comercial com o país e que, portanto, a lógica das tarifas não se sustenta”. A leitura é de que o tarifaço não tinha base econômica sólida.
A retirada parcial das taxas acontece no momento em que os EUA enfrentam inflação elevada e pressão de setores importadores. Com a alta dos alimentos, o governo Trump viu crescer a demanda por flexibilização, o que ajudou a derrubar primeiro a sobretaxa global de 10% e agora o adicional de 40% para itens como carne e café.

Dados oficiais analisados por Chade indicam que o tarifaço ajudou Washington a reduzir em 23% o déficit comercial global entre julho e agosto. O saldo passou de US$ 78,2 bilhões para US$ 59,6 bilhões por causa da queda nas importações. Mas com o Brasil, o movimento foi diferente: os EUA ampliaram seu superávit, reforçando a tese brasileira de que não houve prejuízo ao mercado americano.
Entre janeiro e agosto de 2024, o superávit dos EUA com o Brasil foi de US$ 4,1 bilhões. No mesmo período de 2025, o saldo passou para US$ 6 bilhões. Apenas Reino Unido, Holanda e Hong Kong geraram resultados mais favoráveis. Para o governo brasileiro, esses números mostram que o comércio bilateral funciona de forma equilibrada e sem motivo para punições.
A divulgação tardia dos dados, atrasada pelo shutdown de 43 dias nos EUA, reforçou a leitura de que o impacto das tarifas foi menor do que Trump sugeria inicialmente. A paralisação, a mais longa da história americana, retardou a publicação das estatísticas de janeiro a agosto, que só ficaram disponíveis nesta semana.
Com os números agora públicos, o Itamaraty vê espaço para avançar na negociação e cobrar de Washington uma suspensão total das sobretaxas. A estratégia brasileira é usar o momento de pressão inflacionária nos EUA como argumento para destravar um acordo provisório que alivie exportadores e prepare terreno para uma tratativa mais ampla nos próximos meses.