Retrato do Brasil do golpe: Janot e Gilmar, um caso de amor boca suja. Por Mauro Donato

Atualizado em 23 de março de 2017 às 8:27
Eles
Eles

 

Retrato de uma época. Assim pode ser definida a troca de acusações entre um ministro do Supremo Tribunal Federal e um procurador-geral da República.

Quem está com a razão? Os dois. Quem está fazendo jogo de cena? Os dois.

Gilmar Mendes aponta o dedo para a Procuradoria-Geral da República e a classifica como responsável pelos vazamentos da operação Carne Fraca que, de brinde, citaram o novo ministro da Justiça, Osmar Serraglio.

Disse que os vazamentos eram chantagem, crime até. “Vazamento de informações sob sigilo é eufemismo para crime”, disse Gilmar.

Rodrigo Janot, xerife da PGR, abriu então a caixa de ferramentas e afirmou, sem citar Gilmar diretamente, que quem fez essas insinuações sofre de duas moléstias: decrepitude moral e disenteria verbal. Mais: afirmou que quem deu as declarações é maledicente, insolente, irresponsável, que tem a mente ociosa e dada a devaneios, que comete aleivosias.

Pior, Rodrigo Janot afirmou que quem falou está irritado pois “teve seus interesses contrariados”. Há interesses outros no Judiciário que não sejam o cumprimento da lei? Ajude-nos a entender, Janot.

Segundo o procurador Janot, é Gilmar Mendes quem é chegado na prática de conceder informações sigilosas para jornalistas. E apontou o dedo de volta, lançando suspeitas inclusive sobre a frequência com que Gilmar comparece a jantares com amigos ficha suja.

A dupla é um caso clássico de Spy X Spy, da revista Mad. Os dois brigam não é de hoje e a chapa está quente desde o ano passado, quando magistrados e promotores protocolaram junto a Rodrigo Janot um pedido de apuração e possível abertura de inquérito criminal contra Gilmar Mendes.

Os juízes e procuradores alegavam que as expressões usadas por Gilmar Mendes para criticá-los constituíam uma ‘acusação criminosa’. Sim, classificaram como crime. Va.Excelência versus Va.Excelência.

Janot e Gilmar têm mais em comum do que as rusgas buscam fazer parecer. Rodrigo Janot já declarou que Cunha conduziu bem o processo de impeachment contra Dilma Rousseff. E Gilmar Mendes, que agora é um radical militante contra os vazamentos, à época do impeachment nada se opunha.

Enquanto a carruagem veio atropelando o governo Dilma Rousseff, Gilmar fechou os olhos. Quando ela hoje avança sobre os articuladores do golpe e sobre o PSDB, ele entende que esteja na hora de colocar freios e sai atirando nos caguetas do outro lado.

Passada a fase em que os primeiros alvos já sofreram o desgaste previsto (quando não, incriminados), vem à tona o lodo do fundo da represa. Agora existem tipos diferentes de caixa 2, delações diferentes de falácias, ilegalidades nos vazamentos.

Antes, bastava um delator dizer que ouviu falar que o filho do amigo do vizinho de Lula tinha tocado a campainha e saído correndo que o Jornal Nacional apresentava gráficos em 3D demonstrando o crime.

Onde estavam Janot e Gilmar?

A luta na lama está só começando. Com a aproximação das eleições, cada um irá proteger sua turma e os termos irão progredir de ‘decrépito’, ‘mentecapto’ ou ‘morfético’ para coisas bem piores. Tape o nariz.